Introdução
As línguas de sinais
são línguas naturais porque como as línguas orais sugiram
espontaneamente da interação entre pessoas e porque devido à sua
estrutura permitem a expressão de qualquer conceito - descritivo,
emotivo, racional, literal, metafórico, concreto, abstrato - enfim,
permitem a expressão de qualquer significado decorrente da necessidade
comunicativa e expressiva do ser humano.
Por isso, são complexas porque dotadas
de todos os mecanismos necessários aos objetivos mencionados, porém,
econômicas e “lógicas” porque servem para atingir todos esses objetivos
de forma rápida e eficiente e até certo ponto de forma automática. Isto
porque, tratando-se muitas vezes de significados que demandam operações
complexas que devem ser transmitidas prontamente diante de diferentes
situações e contextos, seus usuários terão que se utilizar dos
mecanismos estruturais que elas oferecem de forma apropriada sem ter que
pensar e elaborar longamente sobre como atingir seus objetivos
linguísticos.
As línguas de sinais distinguem-se das
línguas orais porque utilizam-se de um meio ou canal visual-espacial e
não oral auditivo. Assim, articulam-se espacialmente e são percebidas
visualmente, ou seja, usam o espaço e as dimensões que ele oferece na
constituição de seus mecanismos “fonológicos”, morfológicos, sintáticos e
semânticos para veicular significados, os quais são percebidos pelos
seus usuários através das mesmas dimensões espaciais. Daí o fato de
muitas vezes apresentarem formas icônicas, isto é, formas linguísticas
que tentam copiar o referente real em suas características visuais. Esta
iconicidade mais evidentes nas estruturas das línguas de sinais do que
nas orais deve-se a este fato e ao fato de que o espaço parece ser mais
concreto e palpável do que o tempo, dimensão utilizada pelas línguas
orais-auditivas quando constituem suas estruturas através de seqüências
sonoras que basicamente se transmitem temporalmente.
Entretanto, as formas icônicas das
línguas de sinais não são universais ou o retrato fiel da realidade.
Cada língua de sinais representa seus referentes, ainda que de forma
icônica, convencionalmente porque cada uma vê os objetos, seres e
eventos representados em seus sinais ou palavras sob uma determinada
ótica ou perspectiva.
Por exemplo, o sinal ÁRVORE em LIBRAS
representa o tronco da árvore através do antebraço e os galhos e as
folhas através da mão aberta e do movimento interno dos seus dedos.
Porém, o sinal para o mesmo conceito em CSL (língua de sinais chinesa)
representa apenas o tronco com as duas mãos semiabertas e os dedos
dobrados de forma circular. Em LIBRAS, o sinal CARRO/DIRIGIR é icônico
porque representa o ato de dirigir, porém, é também convencional porque
em outras línguas de sinais não toma necessariamente este aspecto dos
referentes ‘carro’ e ‘ato de dirigir’ como motivação de sua forma mas
sim outros.
Este caráter convencional dos sinais
icônicos atribui a ele um status linguístico posto que é conhecido o
fato de que as palavras das línguas em geral são arbitrárias.
Com isso queremos dizer que ao invés de
rotular todos os chamados signos lingüísticos de arbitrários, seria
melhor considerar que alguns são motivados ou icônicos, porém, todos são
convencionais.
Esta proposta não toma como base apenas
as línguas de sinais mas também as línguas orais. Estas têm sido
estudadas nos últimos anos em seus aspectos também icônicos. No intuito
de tornar alguns conceitos e descrição de eventos mais visíveis,
palpáveis e concretos, as línguas orais usam noções espaciais para
traduzí-las. Por exemplo, alguns conceitos temporais são espacializados
(uma semana atrás, “week ahead”(uma semana à frente)). Alguns eventos
são estruturados cronologicamente ou de forma a reproduzir a sua
natureza contínua ou iterativa (“ele saiu correndo, tropeçou no balde e
caiu” ao invés de “ele caiu porque tropeçou no balde quando saiu
correndo”; e “ele correu, correu, correu até não agüentar mais”). Cada
vez mais alguns lingüístas têm salientado estruturas icônicas ou
motivadas nas línguas orais o que mostra que esta característica não se
encontra presente apenas nas línguas de sinais e que, portanto, melhor
seria preconizar a convencionalidade como propriedade universal dos
“signos” ou formas lingüísticas em detrimento da arbitrariedade.
Com o que dissemos até aqui, podemos
concluir que o meio ou canal que distingue as línguas orais das línguas
de sinais pode privilegiar e explorar características próprias do canal
na constituição das estruturas lingüísticas e na sua articulação e
percepção. Podem mesmo impor restrições aos mecanismos gramaticais como
demonstraremos no decorrer deste texto. Entretanto, essas duas
modalidades de língua apresentam de forma, às vezes, distinta estruturas
geradas a partir de princípios universais e, portanto, comuns.
Basicamente, línguas de sinais e línguas orais são muito semelhantes. As
gramáticas particulares das línguas orais e das línguas de sinais são
intrinsecamente as mesmas posto que seus princípios básicos são
respeitados em ambas as modalidades: elas são dotadas de dupla
articulação (estruturam-se a partir de unidades mínimas distintivas e de
morfemas ou unidades mínimas de significado), usam a produtividade como
meio de estruturar novas formas a partir de outras já existentes,
estruturam suas sentenças a partir dos mesmos tipos de constituintes e
categorias lingüísticas, suas sentenças são estruturadas sempre em torno
de um núcleo com valência, isto é, o núcleo que requer os argumentos
(complementos) necessários para a completude do significado que veicula.
Todas essas colocações serão discutidas a seguir através da descrição
de aspectos estruturais da LIBRAS, os quais serão comparados, sempre que
possível, com os equivalentes em Língua Portuguesa, no intuito de
salientar as diferenças e as semelhanças entre as duas línguas.
No entanto, antes de passarmos à
descrição propriamente dita da LIBRAS, é bom enfatizar que como todas as
línguas ela é natural, isto é, ela é por definição natural.
Assim, não é adequado dizer que a LIBRAS
é a língua natural dos surdos brasileiros. Não, ela é natural devido à
sua própria natureza o que a opõe a sistemas artificiais como o
Esperanto, o Gestuno (sistema de sinais semelhante a um “pidgin”
utilizado por surdos de vários países em sua interação em eventos e
encontros internacionais), os diferentes códigos de comunicação (de
trânsito, das abelhas, dos golfinhos, etc.) e as diferentes linguas
orais sinalizadas (português sinalizado, inglês sinalizado,...).
Dessa forma, considera-se que a LIBRAS é
ou deve ser a língua materna dos surdos não porque é a língua natural
dos surdos mas sim porque, tendo os surdos bloqueios para a aquisição
espontânea de qualquer língua natural oral, eles sim é que só vão ter
acesso a uma língua materna que não seja veiculada através do canal
oral-auditivo.
Esta língua poderia ser uma língua cujo
canal seria o tato. Porém, como a alternativa existente às línguas orais
são as línguas de sinais estas se prestam às suas necessidades. As
línguas de sinais são, pois, tão naturais quanto as orais para todos nós
e, para os surdos, elas são mais acessíveis devido ao bloqueio
oral-auditivo que apresentam, porém, não são mais fáceis nem menos
complexas. Os surdos são pessoas e, como tal, são dotados de linguagem
assim como todos nós. Precisam apenas de uma modalidade de língua que
possam perceber e articular facilmente para ativar seu potencial
lingüístico e, consequentemente, os outros e para que possam atuar na
sociedade como cidadãos normais. Eles possuem o potencial. Falta-lhes o
meio. E a Língua Brasileira de Sinais é o principal meio que se lhes
apresenta para “deslanchar” esse processo.
Estrutura Lingüística da LIBRAS
A
LIBRAS é dotada de uma gramática constituída a partir de elementos
constitutivos das palavras ou itens lexicais e de um léxico (o conjunto
das palavras da língua) que se estruturam a partir de mecanismos
morfológicos, sintáticos e semânticos que apresentam especificidade mas
seguem também princípios básicos gerais. Estes são usados na geração de
estruturas lingüísticas de forma produtiva, possibilitando a produção de
um número infinito de construções a partir de um número finito de
regras. É dotada também de componentes pragmáticos convencionais,
codificados no léxico e nas estruturas da LIBRAS e de princípios
pragmáticos que permitem a geração de implícitos sentidos metafóricos,
ironias e outros significados não literais. Estes princípios regem
também o uso adequado das estruturas linguísticas da LIBRAS, isto é,
permitem aos seus usuários usar estruturas nos diferentes contextos que
se lhes apresentam de forma a corresponder às diversas funções
lingüísticas que emergem da interação do dia a dia e dos outros tipos de
uso da língua.
Veremos a seguir cada um desses conceitos da definição discutidos e ilustrados por estruturas da LIBRAS.
1. O Léxico ou Vocabulário da LIBRAS
O léxico pode ser definido ‘grosso modo’ como o conjunto de palavras de uma língua. No caso da LIBRAS, as palavras ou itens lexicais são os sinais. Pensa-se frequentemente que as palavras ou sinais de uma língua de sinais é constituída a partir do alfabelto manual como por exemplo:
(1) a) C-E-R-T-O b) M-Y-R-N-A c) C-H-O-P-P
Entretanto, não é este o caso. A soletração manual das letras de uma palavra em português, como no exemplo (1), é a mera transposição para o espaço, através das mãos, dos grafemas da palavra da língua oral. Isto é, um meio de se fazerem empréstimos em LIBRAS. Assim, como temos a palavra “xerox” em português que é um empréstimo do inglês, os exemplos em (1) ilustram os inúmeros empréstimos da LIBRAS.
(1-a) é a soletração do nome de uma
pessoa, isto é, de um nome próprio em português porque os nomes
próprios, em LIBRAS, são diferentes. Assim, quando uma pessoa quer
apresentar alguém a alguèm, primeiro soletrará seu nome em português
(M-Y-R-N-A) e, se ele tiver um nome em LIBRAS, este será articulado em
seguida. O exemplo (2) ilustra um usuário da LIBRAS apresentando uma
pessoa chamada Myrna a seu interlocutor.
Exemplo (2):
A: 3 APRESENTAR 2. NOME M-Y-R-N-A. SINAL
MYRNA. ( = Vou apresentá-la a você, o nome dela é M-Y-R-N-A. Seu sinal
(nome próprio em LIBRAS) é Myrna)
(1-b) é a soletração de uma palavra em
português “chopp” palavra para cujo conceito não há sinal ou palavra em
LIBRAS. Neste caso, é a palavra escrita do português que será transposta
para o espaço através da soletração manual.
(1-a) é a soletração de uma palavra em
português para cujo conceito há um sinal em LIBRAS o qual não é
conhecido por um dos usuários, em geral um ouvinte.
Exemplo (3):
A: RESPOSTA CERTO ( = A resposta está certa)
B: O-QUE ISTO, CERTO (= O que quer dizer este sinal?)
A: C-E-R-T-O (= certo)
B: O-K ( Ah! Ok)
B: O-QUE ISTO, CERTO (= O que quer dizer este sinal?)
A: C-E-R-T-O (= certo)
B: O-K ( Ah! Ok)
Ou então, uma pessoa pode soletrar
C-E-R-T-O para mostrar a uma outra como se escreve esta palavra em
português. Neste caso, a soletração manual é um meio de verificação,
questionamento ou veiculação da ortografia de uma palavra em português.
Entretanto, o sinal mesmo para o
conceito “certo” em LIBRAS é o que se segue ao lado da ilustração da
soletração manual da palavra certo:
Agora sim temos uma palavra de LIBRAS.
Podemos perceber que ela não é articulada de forma linear como o são as
soletrações em (1). Esta palavra ou sinal tem uma estrutura distinta
daquela das soletrações ou das palavras em português. As palavras, em
português, são formadas pela justaposição linear de seus componentes ou
unidades mínimas distintas.
Estrutura Sublexical dos Sinais a partir de suas Unidades Mínimas Distintivas
A palavra ou item lexical certo, em português, é formada dos seguintes componentes ou unidades:
em português falado
/sertu/
/sertu/
Temos aqui cinco sons ou fonemas, isto é, cinco componentes ou unidades mínimas da palavra falada certo.
em português escrito
certo
certo
Temos aqui cinco letras ou grafemas componentes da palavra escrita. Não consideramos a letra uma unidade mínima como o fonema porque o fonema, às vezes, é representado, na escrita, por mais de uma letra, como é o caso de:
/xatu/ - chato /x/ - ch
ou, às vezes uma só letra pode representar mais de um fonema, como em :
/leksiku/ - léxico /ks/ - x
Assim, são cinco os componentes ou as
unidades mínimas constitutivas das palavras em português. Essas unidades
mínimas são chamadas fonemas que sabemos ser seqüencialmente combinadas
para formar as palavras.
certo - /s e r t u/
chato - /x a t u/
léxico - /l e k s i k u/
chato - /x a t u/
léxico - /l e k s i k u/
Em LIBRAS, as unidades mínimas ou componentes da palavra ou sinal CERTO são os seguintes:
F é a configuração de mãos
l / é o movimento linear, para baixo com retenção final
TBd é o ponto de articulação do sinal, isto é tronco, busto, lado direito
(Y,Z) (x,y) é a orientação da palma da mão para a esquerda
S é a simetria no movimento ou uso da mão esquerda, realizando o mesmo movimento que a esquerda, também como articulador e não apenas como mão de apoio.
l / é o movimento linear, para baixo com retenção final
TBd é o ponto de articulação do sinal, isto é tronco, busto, lado direito
(Y,Z) (x,y) é a orientação da palma da mão para a esquerda
S é a simetria no movimento ou uso da mão esquerda, realizando o mesmo movimento que a esquerda, também como articulador e não apenas como mão de apoio.
Em português, as unidades mínimas ou componentes da palavra certo /sertu/ podem ser descritas da seguinte forma:
/s/ som com passagem obstruída (consoante), surdo, fricativo.
/e/ som com passagem livre (vogal), sonoro, aberto, médio.
/r/ som com passagem obstruída (consoante), sonoro, vibrante.
/t/ som com passagem obstruída (consoante), surdo, oclusivo.
/u/ som com passagem livre (vogal) sonoro, fechado, posterior.
/e/ som com passagem livre (vogal), sonoro, aberto, médio.
/r/ som com passagem obstruída (consoante), sonoro, vibrante.
/t/ som com passagem obstruída (consoante), surdo, oclusivo.
/u/ som com passagem livre (vogal) sonoro, fechado, posterior.
Pode-se observar pela descrição das
unidades mínimas de CERTO, em LIBRAS, e de certo, em português, que as
características das unidades dos sinais são espaciais (forma da mão ou
do sólido, movimento linear e com retensão, vetores orientacionais da
mão, etc.) e que as características das unidades da palavras faladas são
de natureza acústico-sonoras (passagem livre ou obstruída dos sons,
sonoridade, posição da articulação posterior, frontal, média na boca,
etc.).
Como vimos, as palavras da LIBRAS e do
português se estruturam a partir de unidades mínimas sonoras e
espaciais, respectivamente. Essas unidades ou fonemas, como já dissemos,
são distintivas porque, quando substituídas uma por outra, geram uma
nova forma lingüística com um significado distinto. Por exemplo, em
LIBRAS, temos:
que são duas palavras ou sinais
distintos com significados também distintos somente pelo fato de o
primeiro sinal - APRENDER - ser articulado na testa e de o segundo -
SÁBADO - ser articulado na boca do usuário. Isto é, há uma
característica espacial distinta nos sinais, o ponto de articulação, que
os distingue. Essas características, /na testa/ e /na boca/, são
unidades mínimas distintivas equivalentes aos fonemas das palavras pata e
bata do português, /p/ e /b/, que também distinguem as formas
linguísticas e seus significados. APRENDER e SÁBADO, em LIBRAS, e pata e
bata, em português, são pares mínimos porque suas formas fonológicas
são idênticas em tudo, exceto em uma característica espacial (ponto de
articulação) para os primeiros e fonética (sonoridade) para os últimos.
Vejamos outros pares mínimos em LIBRAS:
Pares Mínimos em LIBRAS
EDUCAR/EDUCAÇÃO ACOSTUMAR/COSTUME
Par mínimo distinto pela Configuração de Mão
Par mínimo distinto pela Configuração de Mão
VERDE (SP) GELADO (SP)
Par mínimo distinto pelo Movimento
Par mínimo distinto pelo Movimento
Através dos exemplos acima em LIBRAS e
em português, mostramos que as palavras da LIBRAS também são
constituídas a partir de unidades mínimas distintivas chamadas, em
línguas orais, de fonemas. O número dessas unidades é finito e pequeno
porque, seguindo o princípio de economia, eles se combinam para gerar um
número infinito de formas ou palavras.
Então, o léxico da LIBRAS, assim como o
léxico de qualquer língua, é infinito no sentido de que sempre comporta a
geração de novas palavras. Antigamente, pensava-se que a LIBRAS era
pobre porque apresentava um número pequeno de sinais ou palavras. Pode
acontecer o fato de que uma língua que não é usada em todos os setores
da sociedade ou que é usada em uma cultura bem distinta da que
conhecemos não apresente vocábulos ou palavras para um determinado campo
semântico, entretanto, isso não significa que esta língua seja pobre
porque potencialmente ela tem todos os mecanismos para criar ou gerar
palavras para qualquer conceito que vier a ser utilizado pela comunidade
que a usa. Por exemplo, a LIBRAS não tinha um sinal para o conceito
“linguística” até há poucos anos. À medida que os surdos foram se
inteirando do que se faz em linguística, do que significa linguística,
houve a necessidade de gerar um sinal para esse conceito. O sinal
LINGUÍSTICA não é soletração da palavra em português, porém, tem um
vestígio de empréstimo porque a configuração de mão escolhida é L
(apenas os dedos polegar e indicador estendidos), uma configuração
própria da LIBRAS, porém, que costuma representar a letra “L”no alfabeto
manual. Este sinal é realizado com as duas mãos, palmas para baixo com o
polegar de uma mão quase tocando o da outra, na frente do busto,
fazendo movimentos de rotação positiva e de translação retilínea para os
lados.
Entretanto, não é qualquer combinação de
unidades mínimas distintivas que será permitida pela língua. Há
restrições e devido a elas é que vamos dizer que certas formas não são
aceitas naquele sistema linguístico enquanto outras o são. Uma forma
como lbresk não será identificado pelos falantes do português como uma
forma bem formada ou como uma palavra dessa língua. Isto porque o padrão
fonológico do português é CV (consoante + vogal) e devido a outros
tipos de restrições. Na forma lbresk o uso de várias consoantes e a
sequência de certos tipos de consoantes faz com que esta forma fuja aos
padrões aceitos pela Língua Portuguesa. Da mesma forma, uma forma
constituída a partir das unidades mínimas da LIBRAS não será aceita
enquanto palavra dessa língua se fugir aos padrões que regem a formação
de suas palavras. Por exemplo, um sinal em que o articulador principal é
a mão esquerda ou em que a mão direita é a mão de apoio não será
considerado uma palavra bem formada da LIBRAS.
As unidades descritas acima são chamadas
unidades mínimas distintivas porque distinguem palavras, como nos
exemplos citados para a LIBRAS, APRENDER e SÁBADO, que se distinguem
pelo ponto de articulação: testa e boca, respectivamente.
Da mesma forma, as palavras pata e bata,
em português, se distinguem pela característica fonética sonoridade, ou
seja, a primeira é surda e a segunda é sonora.
Assim, /p/ e /b/ são duas unidades
mínimas distintivas ou fonemas e os pontos de articulação /na testa/ e
/na boca/ também são unidades mínimas, desta vez da LIBRAS, ou
“fonemas”. Daqui para frente, quando falarmos de “fonemas” da LIBRAS
estamos nos referindo às suas unidades espaciais que não têm nada a ver
com som ou fone, porém, que funcionam igualmente aos fonemas das línguas
orais.
Como pudemos observar, os princípios e
mecanismos que são utilizados na estruturação de palavras a partir de
unidades mínimas são os mesmos em português e em LIBRAS. O que difere é a
natureza das características das unidades que são restritas pela
modalidade oral-auditiva, em português, e pela modalidade
visualespacial, em LIBRAS. É devido às mesmas restrições que as unidades
ou fonemas do português se organizam ou estruturam sequencialmente ou
linearmente no tempo enquanto que as unidades ou “fonemas” da LIBRAS se
estruturam simultaneamente ou ao mesmo tempo no espaço.
As unidades mínimas distintivas em
LIBRAS são as seguintes de acordo com os parâmetros Configuração de
Mãos, Ponto de Articulação, Movimento-Orientação e Expressão Facial.
Vejamos esses parâmetros no sinal CERTO/CERTEZA, ilustrado a seguir:
Figura do sinal certo
com seus parâmetros
com seus parâmetros
As 46 configurações de mão da LIBRAS
Pontos de Articulação da LIBRAS
É preciso também empregar certos adjetivos que localizam mais precisamente os pontos de articulação:
C CABEÇA
topo da cabeça
T testa
R rosto
S parte superior do rosto
I parte inferior do rosto
P Orelha
O olhos
N nariz
B boca
d bochechas
A zona abaixo do queixo
topo da cabeça
T testa
R rosto
S parte superior do rosto
I parte inferior do rosto
P Orelha
O olhos
N nariz
B boca
d bochechas
A zona abaixo do queixo
T TRONCO
P pescoço
O ombro
B busto
E estômago
C cintura
B BRAÇOS
S braço
Q queixo
I antebraço
C cotovelo
P pulso
M MÃO
P palma
C costa da mão
L1 lado do indicador
L2 lado do dedo mínimo
D dedos
Dp ponta dos dedos
Dd nós dos dedos (junção entre os dedos e a mão)
Dj nós dos dedos (primeira junta dos dedos)
D1 dedo mínimo
D2 anular
D3 dedo médio
D4 indicador
D5 polegar
V Interstícios entre os dedos
V1 Interstício entre o polegar e o indicador
V2 Interstício entre os dedos indicador e médio
V3 Interstício entre os dedos médio e anular
V4 Interstício entre os dedos anular e mínimo
p PERNA
EN ESPAÇO NEUTRO
P pescoço
O ombro
B busto
E estômago
C cintura
B BRAÇOS
S braço
Q queixo
I antebraço
C cotovelo
P pulso
M MÃO
P palma
C costa da mão
L1 lado do indicador
L2 lado do dedo mínimo
D dedos
Dp ponta dos dedos
Dd nós dos dedos (junção entre os dedos e a mão)
Dj nós dos dedos (primeira junta dos dedos)
D1 dedo mínimo
D2 anular
D3 dedo médio
D4 indicador
D5 polegar
V Interstícios entre os dedos
V1 Interstício entre o polegar e o indicador
V2 Interstício entre os dedos indicador e médio
V3 Interstício entre os dedos médio e anular
V4 Interstício entre os dedos anular e mínimo
p PERNA
EN ESPAÇO NEUTRO
Outros termos são usados para descrever a
translação horizontal de pontos de articulação como imagens de um ponto
precedente no referencial do corpo:
Na descrição dos pontos de articulação, são ainda usados os seguintes termos:
Movimentos e Tipos de Orientação da LIBRAS
Movimentos internos das mãos:
Expressão não manuais da LIBRAS
Rosto e Cabeça
wh cabeça projetada a frente, olhos levemente cerrados, sobrancelhas franzidas (ex.: o que?, quando?, como?, quando, por que?)
cabeça projetada para trás, e olhos arregalados (ex.: quem?)
wo
Tronco
Movimentos de rotação
Movimentos de translação (as mãos se deslocam no espaço)
Retilíneos
Circulares
Contínuos
Com retensão
Fefreados
Tensos
Simples
Repetidos
Circulares
Contínuos
Com retensão
Fefreados
Tensos
Simples
Repetidos
Formação dos Ítens Lexicais ou Sinais a partir de Morfemas
Mostramos,
no item anterior, como se estruturam as palavras das línguas Portuguesa
e LIBRAS a partir de suas unidades mínimas distintivas ou “fonemas”.
Vamos ilustrar agora como se formam as palavras da LIBRAS a partir de
seus morfemas ou unidade mínimas de significação.
Morfemas Lexicais e Morfemas Gramaticais
Os morfemas são unidades que podem ter
funções lexicais ou gramaticais. Por exemplo, as palavras casas,
construção e impossível do português são constituídas dos seguinte
morfemas:
casa - s (plural)
constru- ção (nome)
possível- im (negação)
morfema lexical morfema gramatical
Em LIBRAS, nem sempre os morfemas que formam as palavras são equivalentes aos do português. Podemos, porém, ilustrar os morfemas da LIBRAS como se segue:
SENTAR - movimento repetido (marca de nome)
BONITO - expressão facial ~~ (marca de grau aumentativo)
BONITO - expressão facial Ô (marca de grau diminutivo)
FALAR - 2 mãos e movimentos longos (aspecto continuativo)
PEGAR - Cl:5 Classificador para objetos redondos grandes
PEGAR - Cl:F Classificador para objetos pequenos e pequenos
PODER - movimentos da cabeça (negação): NÃO-PODER
POSSÍVEL - movimento inverso das mãos (negação): IMPOSSÍVEL
SABER - movimento da mão para fora (negação): NÃO-SABER
morfema lexical morfema gramatical
BONITO - expressão facial ~~ (marca de grau aumentativo)
BONITO - expressão facial Ô (marca de grau diminutivo)
FALAR - 2 mãos e movimentos longos (aspecto continuativo)
PEGAR - Cl:5 Classificador para objetos redondos grandes
PEGAR - Cl:F Classificador para objetos pequenos e pequenos
PODER - movimentos da cabeça (negação): NÃO-PODER
POSSÍVEL - movimento inverso das mãos (negação): IMPOSSÍVEL
SABER - movimento da mão para fora (negação): NÃO-SABER
morfema lexical morfema gramatical
Vejamos algumas ilustrações dos sinais acima:
Formação de Palavras por Derivação e por Composição
As ilustrações acima são exemplos de formação de palavras por derivação.
CADEIRA é derivado de SENTAR através do
movimento repetido do primeiro; BONITINHO é derivado de BONITO através
da adjunção da expressão facial ~~ , marca de grau aumentativo; BONITÃO é
derivado de BONITO através da adjunção do afixo expressão facial Ô,
marca de grau diminutivo; FALAR-SEM-PARAR é derivado de FALAR através da
adjunção da mão esquerda e do alongamento dos movimentos, marca de
aspecto continuativo; PEGAR-BOLA é derivado de PEGAR através da adjunção
do afixo Cl:5, classificador para objetos redondos grandes; PEGARAGULHA
é derivado de PEGAR através da afixação do morfema gramatical Cl:F,
classificador para objetos pequenos e pequenos; NÃO-PODER é derivado de
PODER através do afixo negativo, movimentos da cabeça para os lados;
IMPOSSÍVEL é derivado de POSSÍVEL através da inversão do movimento de
para baixo para os lados, afixo também negativo; NÃO-SABER e derivado de
SABER através da afixação de um movimento da mão para fora, morfema
negativo também.
Através desses exemplos, pudemos
observar que as primeiras palavras são formadas a partir de seus
radicais aos quais se juntam afixos ou morfemas gramaticais, pelo
processo de derivação. As palavras ou sinais em LIBRAS também podem ser
formadas pelo processo de composição, isto é, pela adjunção de dois
sinais simples em formas compostas. Por exemplo:
CASA + CRUZ = IGREJA
MULHER + PEQUENO = MENINA
HOMEM + PEQUENO = MENINO
Alguns sinais como SENTAR e CADEIRA são distintos quanto à forma para as categorias verbo e nome, porém, a maioria deles não se distingue quanto às categorias verbo, nome, adjetivo e advérbio. O que vai definí-las como tal é sua função na sentença. Podemos, entretanto, ilustrar alguns casos de palavras que poderiam ser derivadas de outras como é o caso de construir e construção, em português. Por exemplo, nas sentenças abaixo, identificamos um mesmo item lexical como nome ou verbo, dependendo da sentença em que aparecem:
ELE NÃO LIMPAR-CHÃO-Cl:Y (com escova)
(=Ele não limpou com escova o chão)
ELE LIMPAR-CHÃO-Cl:Y (com escova) NÃO-Y
(=Ele não fez a limpeza do chão com a escova)
No primeiro exemplo, o item lexical LIMPAR-CHÃO-Cl:Y tem uma função verbal.
Entretanto, na segunda sentença,
LIMPAR-CHÃO-Cl:Y tem uma função nominal, ou seja, é um substantivo
porque vem acompanhado de um verbo leve, NÃO-Y, que devido à sua
natureza de verbo sem valência não pode ser considerado um nome.
Neste caso, como os verbos chamados
leves sempre vêm acompanhados de um nome e como o único item capaz de
preencher esta função nominal é o sinal
LIMPAR-CHÃO-Cl:Y, diremos que ele pode pertencer a ambas categorias:
LIMPAR-CHÃO-Cl:Y - verbo
LIMPAR-CHÃO-Cl:Y - nome
LIMPAR-CHÃO-Cl:Y - verbo
LIMPAR-CHÃO-Cl:Y - nome
O mesmo ocorre com as demais categorias: adjetivo, advérbio.
Aspecto Verbal
A LIBRAS, assim como várias línguas de sinais e orais, modula o movimento dos sinais para distinguir entre os aspectos pontual, continuativo ou durativo e iterativo. O aspecto pontual se caracteriza por se referir a uma ação ou evento ocorrido e terminado em algum ponto bem definido no passado. Em português, quando dizemos “ele falou na televisão ontem”, sabemos que a ação de falar se deu no passado, em um período de tempo determinado “ontem”. Em LIBRAS, temos um sinal FALAR para um contexto lingüístico similar. Por exemplo, ELE FALAR VOCÊ ONTEM (=ele falou com você ontem). Entretanto, temos também o sinal FALAR-SEM-PARAR que se refere a uma ação que tem uma continuidade no tempo como no exemplo ELE FALAR-SEM-PARAR AULA (=ele falou sem parar durante a aula).
Vejam estes dois sinais:
O mesmo ocorre com o verbo OLHAR que
pode sofrer alteração em um ou mais de seus parâmetros e, então, denotar
aspecto durativo. Os sinais ilustrados abaixo poderiam aparecer em
contextos lingüísticos como os que se seguem:
No segundo sinal para "olhar", a
configuração de mão e o ponto de articulação mudam de G1 para 5 e dos
olhos para o nariz. Com isso temos a formação de uma outra palavra com
valor aspectual durativo.
O verbo VIAJAR com valor aspectual
pontual abaixo poderia ser utilizado em sentenças como PAULO VIAJAR
BRASÍLIA ONTEM, enquanto que o sinal verbal com valor iterativo
apareceria em sentenças do tipo PAULO VIAJAR- MUITAS-VEZES. O aspecto
iterativo refere-se a ação ou evento que se dá repetidas vezes. Vejamos
os sinais abaixo:
Esse tipo de afixação que encontramos na
LIBRAS, através da alteração do movimento, da configuração de mão e/ou
do ponto de articulação do verbo que seria considerado raiz ou radical,
não é encontrado em português.
Itens Lexicais para Tempo e Marca de Tempo
A LIBRAS não tem em suas formas verbais a marca de tempo como o português.
Como vimos, essas formas podem se modular para aspecto. Algumas delas também se flexionam para número e pessoa.
Dessa forma, quando o verbo refere-se a
um tempo passado, futuro ou presente, o que vai marcar o tempo da ação
ou do evento serão itens lexicais ou sinais adverbiais como ONTEM,
AMANHÃ, HOJE, SEMANA-PASSADA, SEMANA-QUE-VEM. Com isso, não há risco de
ambigüidade porque sabe-se que se o que está sendo narrado iniciou-se
com uma marca no passado, enquanto não aparecer outro item ou sinal para
marcar outro tempo, tudo será interpretado como tendo ocorrido no
passado.
Os sinais que veiculam conceito
temporal, em geral, vem seguidos de uma marca de passado, futuro ou
presente da seguinte forma: Movimento para trás, para o passado;
Movimento para frente, para o futuro; e Movimento no plano do corpo,
para presente. Alguns desses sinais, entretanto, incorporam essa marca
de tempo não requerendo, pois, uma marca isolada como é o caso dos
sinais ONTEM e ANTEONTEM ilustrados a seguir:
Outros sinais como ANO requerem o
acompanhamento de um sinal de futuro ou de presente, mas, quando se
trata de passado, ele sofre uma alteração na direção do movimento de
para frente para trás e, por si só já significa "ano passado". Os sinais
de ANO e ANO-PASSADO podem ser observados nas ilustrações que se
seguem:
É interessente notar, que uma linha do
tempo constituída a partir das coordenadas: passado (atrás)- presente
(no plano do corpo)- futuro (na frente), pode ser observada também em
línguas orais como o português e o inglês como mencionado no início
desse curso. Uma estruturação completamente diferente do tempo foi
observada por nós na Língua de Sinais Urubu-Kaapor, língua de sinais da
comunidade indígena Urubu habitante da Floresta Amazônica, onde o tempo
futuro é para cima e o presente no torso do usuário dessa língua. O
passado não parece ser marcado.
Isso levou-nos a considerar que as
línguas Portuguesa e LIBRAS não são tão distintas assim naquilo que não
depende de restrições decorrentes da modalidade visual-espacial,
veiculando,assim, uma visão de mundo muito similar, pelo menos nos
aspectos semânticos até o momento estudados por nós.
As diferenças que vimos apontando
ultimamente na estruturação gramatical e lexical da LIBRAS e do
português parecem não apontar tanto para diferenças culturais mas são
sim devidas ao fato de a primeira usar o espaço e de a segunda utilizar o
meio acústico, para estruturar os significados lexicais e gramaticais.
Quantificação e Intensidade
A quantificação é obtida em LIBRAS através do uso de quantificadores como MUITO, mas incorporar a quantificação, prescindindo, pois, o uso desse tipo de palavras. Assim, podemos observar nos exemplos com o verbo OLHAR acima que o olhar pontual é realizado com apenas um dedo estendido enquanto que os outros dois sinais são realizados com as mãos abertas, ou seja, com os dedos estendidos. Dessa forma, esse tipo de alteração do parâmentro Configuração de Mão iconicamente representa uma maior intensidade na ação (FICAR-OLHANDO-LONGAMENTE) ou
um maior número de referentes sujeitos (TODOS-FICAR-OLHANDO). Essa mudança de configuração de mãos, aumentando-se o número de dedos estendidos para significar uma quantidade maior pode ser ilustrado pelos sinais UMA-VEZ, DUAS-VEZES, TRÊS-VEZES:
Às vezes, alongando-se o movimento dos
sinais e imprimindo-se a ele um rítmo mais acelerado, obtem-se uma maior
intensidade ou quantidade. Isto é o que ocorre com os sinais FALAR e
FALAR-SEM-PARAR, exemplificados acima e com os sinais LONGE e
MUITO-LONGE ilustrados abaixo:
Como se pode observar, os mecanismos
espaciais utilizados pela LIBRAS para obter significados e efeitos de
sentido distinguem-se daqueles utilizados pela Língua Portuguesa. Nesta,
as formas ou marcas são muito mais arbitrárias e se apresentam em forma
de segmentos sequencialmente acrescentados ao item ou palavra
modificada. Em LIBRAS, ocorre com muita frequência uma mudança interna,
isto é, uma alteração no interior da própria palavra.
Classificadores
Como algumas línguas orais e como várias línguas de sinais, a LIBRAS possui classificadores, um tipo de morfema gramatical que é afixado a um morfema lexical ou sinal para mencionar a classe a que pertence o referente desse sinal, para descrevê-lo quanto à forma e tamanho, ou para descrever a maneira como esse referente é segurado ou se comporta na ação verbal.
Os classificadores em línguas orais como o japonês e o navajo são sufixos dos numerais e dos verbos, respectivamente.
Em LIBRAS, como dificilmente se pode
falar em prefíxo e em sufíxo porque os morfemas ou outros componentes
dos sinais se juntam ao radical simultaneamente, preferimos dizer que os
classificadores são afixos incorporados ao radical verbal ou nominal.
Assim, nos exemplos abaixo, pode-se observar o classificador V e V, que
respectivamente, referem-se à maneira como uma pessoa anda e como um
animal anda.
O classificador em ANDAR (para pessoa)
pode ser utilizado também com outros significados como "duas pessoas
passeando" ou "um casal de namorados" (no caso das pontas dos dedos
estarem voltadas para cima), "uma pessoa em pé" (pontas dos dedos para
baixo), etc. Este classificador é representado pela configuração de mãos
em V, como se segue:
O classificador C pode representar
qualquer tipo de objeto cilíndrico profundo como um copo, uma caixa, uma
urna como no exemplo abaixo do sinal VOTAR:
Outros classificadores podem ser os morfemas representados pelas configurações de mão B e Y como se segue:
O classificador B refere-se e descreve
superfícies planas como mesa, parede, chão, etc. enquanto que o
classificador Y refere-se e descreve objetos multiformes ou com formas
irregulares, porém não planos nem finos. O classificador G1 é que é
utilizado para descrever objetos finos e longos.
Inúmeros são os classificadores em LIBRAS, sua natureza semântica e sua função.
Entretanto, apenas mencionamos alguns a título de ilustração.
Incorporação de Argumento
As línguas orais e de sinais apresentam vários casos de incorporação de argumento ou complemento. Por exemplo, em português, podemos citar o verbo engavetar que, em uma análise sintático-semântica, poderia ser decomposto em um verbo básico do tipo colocar e em um complemento desse verbo que seria um locativo na gaveta. Assim, podemos dizer “eu coloquei os livros na gaveta” ou “eu engavetei os livros”. O constituinte na gaveta, um locativo, argumento ou complemento de colocar, foi incorporado a este verbo e em decorrência disso temos a outra forma verbal engavetar que prescinde do locativo como complemento porque já carrega esta informação em seu próprio item lexical. Temos, pois, uma forma lexical derivada de outra mais básica, porém, desta vez não pelo processo de derivação por afixação nem por composição, como discutido acima, mas sim pelo que se chama de incorporação de argumento.
Em LIBRAS, o processo de incorporação de
argumento é muito frequente e visível devido às características
espaciais e icônicas dos sinais. Os três verbos abaixo ilustram esse
tipo de incorporação. O primeiro, o verbo BEBER/TOMAR pode ser usado sem
incorporação em sentenças do tipo:
BEBER CERVEJA (= eu bebi cerveja)
Porém, se o objeto direto do verbo for,
por exemplo, café ou chá, o verbo incorporará este argumento e teremos
formas verbais diferentes, como demonstram as ilustrações a seguir:
Outro exemplo de incorporação pode ser
ilustrado pelo verbo ALUGAR/PAGARMENSALMENTE em que o verbo PAGAR que
normalmente é articulado sobre a mão de apoio em B passa a ser
articulado na mão de apoio (mão esquerda) em G1, a mesma do sinal MÊS.
Assim, uma parte deste sinal incorpora-se ao sinal PAGAR,
substituindo-a. Vejamos o sinal:
O mesmo processo de incorporação pode
ser também observado no sinal que deriva do sinal verbal COMER, ao qual
se incorpora o objeto direto MAÇÃ:
Estruturação de Sentenças em LIBRAS
Costuma-se
pensar que as sentenças da LIBRAS são completamente diferentes do ponto
de vista estrutural daquelas do português. Realmente, no que diz
respeito à ordem das palavras ou constituinte, há diferenças porque o
português é uma língua de base sujeito-predicado enquanto que a LIBRAS é
uma língua do tipo tópico-comentário.
Nas sentenças do português, a ordem
predominante é: sujeito (S)-verbo(V)-objeto (O), normalmente chamada de
SVO. Assim, as sentenças se estruturam da seguinte maneira:
O leão matou o urso.
S V O
sujeito predicado
Todos os meninos gostam de futebol
S V O
sujeito predicado
S V O
sujeito predicado
Nestas sentenças, além da concordância sujeito-predicado que determina quem faz o que no evento descrito pelo verbo da sentença, a ordem também é significativa porque senão não saberíamos qual é o sujeito da primeira sentença “o leão matou o urso” porque tanto o constituinte “o leão” quanto o constituinte “o urso” podem concordar com o verbo. Então, se alterássemos a ordem dos constituintes acima “o urso matou o leão”, o sujeito deixaria de ser “o leão” para ser “o urso”. Além do mais, há o aspecto semântico dos constituintes e do verbo que permite que tanto um quanto outro constituinte seja o sujeito de “matar”, isto é, aquele que mata.
Este não é o caso da segunda sentença
onde o significado dos constituinte “todos os meninos” e “futebol” não
dá margem às duas possibilidades acima. Além do mais, a concordância
sujeito-predicado nesta segunda sentença fica ressaltada pelo fato de
incluirem a marca de plural enquanto que o segundo constituinte
“futebol”está no singular. Neste caso, a ordem é menos relevante para se
saber a função gramatical e o papel semântico dos dois constituintes.
Entretanto, a primeira sentença poderia
ter o seu último constituinte deslocado para a frente da sentença
através de operações como por exemplo a topicalização:
O urso, o leão matou ou Ao urso o leão matou
tópico comentário tópico comentário
Note-se, porém, que nos dois casos houve necessidade de apelo a mecanismos inusuais do tipo entoação e uso da preposição “a”. Nestes casos, “o urso” continua sendo o objeto direto de “matar” e “o leão”, o seu sujeito, apesar de termos a topicalização do objeto, isto é, apesar do objeto direto ser o tópico da sentença e o sujeito e o verbo serem o comentário do tópico.
A topicalização é relativamente
frequente em português, principalmente, na fala coloquial. Entretanto,
em LIBRAS, a frequência é maior, diríamos até que é regra geral.
Em estudos anteriores, dissemos que a
ordem preferencial das sentenças da LIBRAS era SVO quando não havia
topicalização ou verbos com flexão ou direcionais.
Porém, estudos mais aprofundados, apesar
de não desmentirem o que dissemos, mostraram que a topicalização é
muito mais frequente do que se pensa à primeira vista em LIBRAS. A ordem
tópico-comentário é realmente a preferida quando não há restrições que
impeçam certos constituintes de se deslocarem. Pórem, um grande número
de sentenças sempre aparece na ordem SVO. Vejamos os exemplos:
VOCÊ LER JORNAL (= você leu o jornal?)
S V O
NÃO-ENXERGAR VOCÊ (= eu não vi você)
V O
S V O
NÃO-ENXERGAR VOCÊ (= eu não vi você)
V O
Nestas duas sentenças, a ordem é SVO, isto é, sujeito-verbo-objeto. O sujeito da segunda sentença é omitido, é um argumento implícito, porque a , em LIBRAS, assim como em português, o sujeito em geral é pressuposto pelo contexto ou, quando referindo-se à primeira pessoa é sempre pressuposto como conhecido pelo interlocutor. Assim, se no contexto não está evidente que uma outra pessoa além da primeira deve ser o sujeito, este será a primeira pessoa. Então, apesar de estarem explícitos apenas o verbo e o objeto da segunda sentença, sabemos que a ordem é SVO. Estes dados reafirmam nossos estudos anteriores, assim como o fato de que quando temos um verbo flexionado na sentença a ordem é muito restrita.
Verbos com flexão com VER, AVISAR,
RESPONDER, PERGUNTAR, AJUDAR são verbos em que a ordem vai ser sempre
SVO. Note-se que não estamos distinguindo aqui objeto direto de objeto
indireto porque, em recentes estudos em lingüística, há a proposta de
considerarmos os complementos sem preposição como objetos e os com
preposição como objetos oblíquos. Em exemplos com os verbos acima,
podemos notar a restrição quanto à ordem porque o sujeito e o objeto não
aparecem na forma de constituintes separados dos verbos, mas sim na
forma de flexão do próprio verbo através da direcionalidade de seu
movimento, um vetor, cujo ponto de origem referese ao sujeito e cujo
ponto final refere-se ao objeto. É a direcionalidade com esses dois
pontos que é chamada flexão verbal.
Vejamos os exemplos:
1a RESPONDER 2a (=eu respondi a você)
3a PERGUNTAR 1a VERDADE (=ele perguntou a mim a verdade)
VERDADE 3a PERGUNTAR 1a (=a verdade ele perguntou a mim)
1a VER 2a (=eu vi você)
MYRNA 3a AVISAR 3a SERGIO (=Myrna, ela avisou ele, Sergio)
2a AJUDAR 3a - você-ajudar-ela (=você a ajudou)
3a PERGUNTAR 1a VERDADE (=ele perguntou a mim a verdade)
VERDADE 3a PERGUNTAR 1a (=a verdade ele perguntou a mim)
1a VER 2a (=eu vi você)
MYRNA 3a AVISAR 3a SERGIO (=Myrna, ela avisou ele, Sergio)
2a AJUDAR 3a - você-ajudar-ela (=você a ajudou)
Como se pode observar, nestes exemplos, o
primeiro referente é sempre o sujeito porque é representado pela marca
que inicia o verbo e o outro referente não verbal é o que é marcado pela
marca final do verbo ou o ponto final do seu movimento, o que resulta
na ordem Sujeito- Verbo-Objeto (direto e indireto). O terceiro exemplo
acima apresenta uma topicalização do objeto direto o que faz com que a
ordem seja Objeto dir.- Sujeito - Verbo - Objeto ind.
Na maioria dos casos, entretanto, a
LIBRAS parece preferir, como já dissemos, a topicalização e o verbo no
final da sentença como nos exemplos abaixo:
PESQUISAR ELA NÃO-GOSTAR (=pesquisar, ela não gosta)
tópico comentário
RUA ACIDENTE NÃO-ENXERGAR (=o acidente na rua eu não vi)
tópico comentário
CAFÉ AÇÚCAR NÃO-Y (=açucar no café (ela) não pôs)
tópico comentário
tópico comentário
RUA ACIDENTE NÃO-ENXERGAR (=o acidente na rua eu não vi)
tópico comentário
CAFÉ AÇÚCAR NÃO-Y (=açucar no café (ela) não pôs)
tópico comentário
Note-se, porém, que nos exemplos acima,
mesmo seguindo a estrutura tópicocomentário, a ordem dos constituintes
acaba sendo (Locativo) - Objeto - Sujeito- Verbo. Mesmo com
topicalização, parece que temos quase que sempre, pelo menos, tópico-SV
(tópico-sujeito-verbo). Na última sentença, o sujeito é uma terceira
pessoa, porém, é um argumento implícito porque o enunciador pressupõe
que o interlocutor saiba identificar o referente pelo contexto
situacional. A título de ilustração, vejamos o verbo EMPRESTAR, variante
de São Paulo, e algumas de suas flexões:
Alguns raros verbos com flexão trazem as
marcas de sujeito e objeto de forma inversa, isto é, o objeto é marcado
primeiro no ponto de origem do movimento do sinal verbal e o sujeito é
marcado pelo ponto final do movimento do sinal verbal. Vejamos o verbo
CONVIDAR:
Vimos que a estruturação das sentenças
em LIBRAS quanto à ordem dos argumentos (complementos inclusive sujeito)
é diferente daquela do português e que inclusive as marcas de flexão
são bastante específicas da modalidade visual-espacial de língua porque
se apoiam na direcionalidade do movimento do sinal.
Entretanto, vamos enfatizar aqui um
nivel estrutural das sentenças em ambas as línguas em que as semelhanças
são bem maiores do que as especificidades. Trata-se da estrutura
argumental das sentenças. Desse ponto de vista, toda sentença tem um
núcleo que é o elemento que possui valência. Em geral, o verbo é que
possui valência e, como tal, é ele que determina o número e tipos de
argumentos ou complementos necessários. Dentro desta concepção,
inclusive o sujeito é considerado um argumento. Assim diremos que um
verbo como “enviar”, em português, e ENVIAR, em LIBRAS, são verbos com a
mesma valência porque os dois pedem três argumentos ou complementos:
Paulo enviou o livro ao amigo
LIVRO AMIGO P-A-U-L-O ENVIAR (o livro ao amigo o Paulo enviou)
LIVRO AMIGO P-A-U-L-O ENVIAR (o livro ao amigo o Paulo enviou)
Nos dois exemplos, o primeiro em
português e o segundo em LIBRAS, independentemente da ordem, pode-se
observar que as sentenças são constituídas de um núcleo e de três
argumentos ou complementos:
enviar - núcleo ou palavra com valência
Paulo - argumento 1, aquele que envia, papel semântico ‘fonte’, função gramatical ‘sujeito’.
amigo - argumento 2, aquele para quem se envia, papel semântico ‘alvo’, função gramatical ‘objeto indireto’
livro - argumento 3, aquilo que é enviado, papel semântico ‘tema’, função
gramatical ‘objeto direto’.
Esse tipo de análise das sentenças da LIBRAS e do português mostra como a estrutura sintático-semântica pode ser a mesma.
Alguns verbos, entretanto, não possuem
valência como os verbos levar, dar e fazer do português e o verbo NÃO-Y
da LIBRAS. Neste caso, teremos uma diferença considerável, devido à não
correspondência sintático-semântica nas duas lín-guas.
São os chamados verbos leves que podem ser ilustrados pelos exemplos abaixo:
Ele levou a cabo seus estudos
João deu uma surra no menino
Nós fizemos compras ontem
LIMPAR-CHÃO-ESCOVA NÃO-Y (a limpeza do chão com a escova, ele não fez)
Nesses exemplos, o elemento com valência é o nome que acompanha o verbo nos exemplos do português e o nome que antecede o verbo no exemplo da LIBRAS. Este nome é que é o núcleo da estrutura argumental da sentença porque é ele que possui valência. O verbo carrega apenas as marcas gramaticais. É o nome que veicula o significado lexical do complexo verbal. Por isso, apesar de se assemelhar a um objeto direto, o nome com valência não pode receber papel temático (semântico) o que torna esse tipo de sentença mais complexo para analisar.
Aquisição da Linguagem por Crianças Surdas
Todas
as pesquisas desenvolvidas nos últimos anos sobre a aquisição das
línguas de sinais evidenciam que essa pode ser comparada à aquisição das
línguas orais em muitos sentidos. Normalmente, as pesquisas envolvem a
análise de produções de crianças surdas, filhas de pais surdos.
Somente esse grupo de crianças surdas apresenta o input lingüístico
adequado e garantido para possíveis análises do processo de aquisição.
Entretanto, ressalta-se que essas crianças representam apenas de 5% a
10% das crianças surdas . No Brasil, os estudos envolvem crianças
surdas filhas de pais surdos que usam a Língua Brasileira de Sinais -
LIBRAS.
As línguas de sinais são sistemas
abstratos de regras gramaticais, naturais às comunidades surdas dos
países que as utilizam. Assim como as línguas faladas, as línguas de
sinais não são universais: cada país apresenta a sua própria língua. No
caso do Brasil, como já foi citado, tem-se a LIBRAS e, além dessa,
tem-se também a língua de sinais usada por uma tribo indígena
brasileira chamada Urubu Kaapor, citada por Kakumasu (1968) e Ferreira
Brito (1993).
As línguas de sinais apresentam-se numa
modalidade diferente das línguas oraisauditivas; são línguas
espaço-visuais, ou seja, a realização dessas línguas não é estabelecida
através do canal oral-auditivo, mas através da visão e da utilização
do espaço. A diferença na modalidade determina o uso de mecanismos
sintáticos específicos diferentes dos utilizados nas línguas orais. As
línguas de sinais são sistemas lingüísticos independentes dos sistemas
das línguas orais e não são universais.
As línguas de sinais, dentre elas a
LIBRAS, parecem apresentar especial interesse nas pesquisas
lingüísticas dentro da perspectiva gerativista. A razão de tal
interesse está relacionada à possibilidade de determinar os princípios
da UG independentemente da modalidade da língua. Se isso for possível,
as línguas de sinais podem ser exemplos de línguas que fortalecem a
proposta gerativista quanto à existência de um módulo da linguagem na
mente/cérebro do ser humano.
Quanto aos aspectos estruturais das
línguas de sinais, há dois aspectos fundamentais: (a) o estabelecimento
nominal e a pronominalização e (b) a concordância verbal. Os sujeitos e
objetos podem ser estabelecidos em um ponto no espaço de sinalização
(loc) ; quando isso ocorre, há um estabelecimento nominal e a
pronominalização. Esse estabelecimento é completamente espacial e é
fundamental para a concordância verbal, principalmente com referentes
não presentes.
Considerando que o processo de
aquisição das línguas de sinais é análogo ao processo de aquisição das
línguas faladas, as seções seguintes estão subdivididas nos estágios de
aquisição adotados nos estudos sobre a aquisição da linguagem. O
estabelecimento nominal, o sistema pronominal e a concordância verbal
serão enfatizados tendo em vista que tais tópicos são fundamentais para
o estabelecimento de relações gramaticais (espaciais).
Período Pré - Lingüístico
Petitto & Marantette (1991)
realizaram um estudo sobre o balbucio em bebês surdos e bebês ouvintes
no mesmo período de desenvolvimento (desde o nascimento até por volta
dos 14 meses de idade). Elas verificaram que o balbucio é um fenômeno
que ocorre em todos os bebês, surdos assim como ouvintes, como fruto da
capacidade inata para a linguagem. As autoras constataram que essa
capacidade inata é manifestada não só através de sons, mas também
através de sinais. Nos dados analisados por Petitto & Marantette
foram observadas todas as produções orais para detectar a organização
sistemática desse período. Também foram observadas todas as produções
manuais tanto dos bebês surdos como dos bebês ouvintes para verificar a
existência ou não de alguma organização sistemática.
Nos bebês surdos foram detectadas duas
formas de balbucio manual: o balbucio silábico e a gesticulação. O
balbucio silábico apresenta combinações que fazem parte do sistema
fonético das línguas de sinais. Ao contrário, a gesticulação não
apresenta organização interna.
Os dados apresentam um desenvolvimento
paralelo do balbucio oral e do balbucio manual. Os bebês surdos e os
bebês ouvintes apresentam os dois tipos de balbucio até um determinado
estágio e desenvolvem o balbucio da sua modalidade. É por isso que os
estudos afirmavam que as crianças surdas balbuciavam (oralmente) até um
determinado período. As vocalizações são interrompidas nos bebês
surdos assim como as produções manuais são interrompidas nos bebês
ouvintes, pois o input favorece o desenvolvimento de um dos modos de
balbuciar.
As semelhanças encontradas na
sistematização das duas formas de balbuciar sugerem haver no ser humano
uma capacidade lingüística que sustenta a aquisição da linguagem
independente da modalidade da língua: oral-auditiva ou espaço-visual.
Estágio de um Sinal
O estágio de um sinal inicia por volta dos 12 meses da criança surda e percorre um período até por volta dos 2 anos. Karnopp (1994) cita estudos que apontam o início do estágio de um sinal por volta dos 6 meses em bebês surdos filhos de pais surdos adquirindo língua de sinais. Por outro lado, sabe-se que os estudos de crianças adquirindo línguas orais iniciam esse período por volta dos 12 meses. Lillo-Martin (1986) observa que as razões apontadas por esses estudos para explicar tal diferença cronológica baseia-se no desenvolvimento dos mecanismos físicos (mãos e trato vocal). Entretanto, Petitto (1987) argumenta que a criança simplesmente produz gestos que diferem dos sinais produzidos por volta dos 14 meses, analisando essa produção gestual como parte do balbucio, período pré-lingüístico. As primeiras produções na Língua de Sinais Americana - ASL incluem as formas chamadas congeladas da produção adulta. São sinais que não são flexionáveis, tipo MOTHER na ASL. Quando um sinal apresenta flexões no padrão adulto, a criança usa formas morfofonêmicas.
Petitto & Bellugi (1988) observaram
que as crianças surdas com menos de 2 anos não fazem uso dos
dispositivos indicativos da ASL. Os dispositivos indicativos envolvem o
sistema pronominal das línguas de sinais. As crianças omitiam essas
indicações até quando imitavam seus pais. Petitto (1987) e Bellugi
& Klima (1989) analisaram a descontinuidade no uso da indicação
(apontação) nas crianças surdas.
As crianças surdas com menos de 1 ano, assim como as crianças ouvintes, apontam freqüentemente para indicar objetos e pessoas. Mas quando a criança entra no estágio de um sinal, o uso da apontação desaparece. Petitto (1987) sugere que nesse período parece ocorrer uma reorganização básica em que a criança muda o conceito da apontação inicialmente gestual (pré-lingüística) para visualizá-la como elemento do sistema gramatical da língua de sinais (lingüístico).
As crianças surdas com menos de 1 ano, assim como as crianças ouvintes, apontam freqüentemente para indicar objetos e pessoas. Mas quando a criança entra no estágio de um sinal, o uso da apontação desaparece. Petitto (1987) sugere que nesse período parece ocorrer uma reorganização básica em que a criança muda o conceito da apontação inicialmente gestual (pré-lingüística) para visualizá-la como elemento do sistema gramatical da língua de sinais (lingüístico).
Estágios das Primeiras Combinações
Surgem as primeiras combinações de sinais por volta dos 2 anos das crianças surdas. Fischer (1973) e Hoffmeister (1978) observaram que a ordem usada pelas crianças surdas durante esse estágio é SV, VO ou, ainda, num período subseqüente, SVO. Meier (1980) verificou que a ordem das palavras é utilizada para o estabelecimento das relações gramaticais.
Meier (1980) observou que, assim como o
Japonês e o Croata, nem todos os verbos da ASL podem ser flexionados
para marcar as relações gramaticais em uma sentença. Há alguns tipos de
verbos que apresentam limitações lexicais e fonológicas para
incorporar os pronomes como, por exemplo, os verbos ancorados no corpo,
como GOSTAR e PENSAR na LIBRAS. Isso sugere que as crianças surdas
devem adquirir duas estratégias para marcar as relações gramaticais: a
incorporação dos indicadores e a ordem das palavras. A incorporação dos
indicadores envolve a concordância verbal, e essa depende diretamente
da aquisição do sistema pronominal.
No estágio em discussão, as crianças
começam a usar o sistema pronominal, mas de forma inconsistente. Os
estudos realizados por Bellugi & Klima (1979) detectaram que o
padrão de aquisição das crianças surdas é bastante próximo ao das
crianças ouvintes. Eles, a princípio, consideravam que seria mais fácil
para as crianças surdas a aquisição do sistema pronominal.. Os
resultados foram surpreendentes. Os pronomes EU e TU na ASL são
identificados através da indicação propriamente dita, a si mesmo e ao
outro, respectivamente. Parece óbvio que uma criança aprendesse essa
regra rapidamente e a usasse sem cometer erros. Mas o que acontece é,
na verdade, diferente.
Assim como na aquisição do Inglês por
crianças ouvintes, a aquisição na ASL desses pronomes apresenta as
mesmas características conforme mencionam os estudos de Petitto (1986,
1987). Petitto (1986) observou que nesse período ocorrem "erros" de
reversão pronominal, assim como ocorrem com crianças ouvintes. As
crianças usam a apontação direcionada ao receptor para referirem-se a
si mesmas. A princípio, causa uma certa surpresa constatar esse tipo de
erro nas crianças surdas devido à aparente transparência entre a forma
de apontação e o seu significado. Esse tipo de erro e a evitação do
uso dos pronomes são fenômenos diretamente relacionados com o processo
de aquisição da linguagem.
Petitto descarta a hipótese de mudança
de perspectiva, pois, no caso das línguas de sinais, se essa hipótese
fosse verdadeira, as crianças deveriam apresentar erros na perspectiva
de todos os sinais. Para Petitto, a criança usa o sinal "YOU" como um
item congelado, não dêitico, não recíproco e que refere somente a ela.
Petitto (1987) concluiu que, apesar da aparente relação entre forma e
significado da apontação, a compreensão dos pronomes não é óbvia para a
criança dentro do sistema lingüístico da ASL. A aparente transparência
da apontação é anulada diante das múltiplas funções lingüísticas que
apresenta. Se as crianças não entenderem a relação indicativa entre a
forma apontada e o seu referente, a plurificação da apontação pode
tornar-se uma dificuldade na aquisição dos mecanismos gramaticais.
Esse estudo nos revela evidências da
descontinuidade da transição dos fatores prélingüísticos aos
lingüísticos. Petitto afirma que aspectos da estrutura lingüística e da
sua aquisição, parecem envolver conhecimentos específicos da
linguagem. Ela conclui que, apesar da relação entre a forma e o
símbolo, a apontação e seu significado, a compreensão das funções da
apontação dos pronomes não é óbvia para a criança dentro do sistema
lingüístico da ASL. A idéia de que a gesticulação pode funcionar
lingüisticamente é tão forte, que anula a transparência indicativa da
apontação.
As semelhanças na aquisição do sistema
pronominal entre crianças ouvintes e surdas, sugerem um processo
universal de aquisição de pronomes, apesar da diferença radical na
modalidade.
Hoffmeister (1978) observou que a
apontação envolve o sistema pronominal, o sistema dos determinadores e
modificadores, o sistema de pluralização e a modulação do sistema
verbal. No estágio das primeiras combinações, Hoffmeister observou que
os objetos são nomeados e referidos somente em situações do contexto
imediato.
Na LIBRAS, Quadros (1995) observou
algumas combinações de sinais, normalmente envolvendo dois a três
sinais . F omitiu o sujeito de referentes presentes somente quando esse
era óbvio (presente no contexto do discurso), mas normalmente
pronunciou o sujeito. Não foi observada a omissão do objeto nesse
período.
Certamente a razão de terem aparecido
sujeitos, mas não objetos nulos, está relacionada ao uso sintático do
espaço que ainda não é observado, nesse período, de forma consistente.
Deve-se ressaltar que F não estabeleceu a terceira pessoa em (1b) em um
ponto do espaço. Tal referência foi interpretada como terceira pessoa
mediante o contexto e não mediante a utilização de recursos sintáticos.
Nos dois casos o verbo não foi flexionado; portanto, pode-se sugerir
que F usa apenas formas congeladas, pois IR é um verbo com concordância
na LIBRAS e F usou-o sem flexioná-lo.
Estágio de Múltiplas Combinações
Em torno dos 2 anos e meio a 3 anos, as crianças surdas apresentam a chamada explosão do vocabulário. Lillo-Martin (1986) cita que nesse período começam a ocorrer distinções derivacionais (por exemplo, a diferenciação entre CADEIRA e SENTAR). As crianças começam a usar formas idiossincráticas para diferenciar nomes e verbos. O domínio completo dos recursos morfológicos da língua é totalmente adquirido por volta dos 5 anos.
Segundo Bellugi & Klima (1989), a
criança surda ainda não usa os pronomes identificados espacialmente para
referir-se às pessoas e aos objetos que não estejam fisicamente
presentes. Ela usa substantivos não associados com pontos no espaço.
Mesmo quando a criança apresenta algumas
tentativas de identificação de pontos no espaço, ela apresenta falhas
de correspondência entre a pessoa e o ponto espacial.
Com referentes presentes no discurso já
há o uso consistente do sistema pronominal e inclusive indicações
espaciais (indicações ostensivas).
Dos 3 anos em diante, as crianças
começam a usar o sistema pronominal com referentes não presentes no
contexto do discurso, mas ainda apresentam erros.
Algumas crianças empilham os referentes
não presentes em um único ponto do espaço. Petitto & Bellugi (1988)
observaram que, de 3 anos a 3 anos e meio, as crianças usam a
concordância verbal com referentes presentes. Entretanto, elas flexionam
alguns verbos cuja flexão não é aceita nas línguas de sinais. Bellugi
& Klima (1990) identificam essa flexão generalizada dos verbos nesse
período como supergeneralizações, considerando esse fenômeno análogo a
generalizações verbais como "fazi", "gosti" e "sabo" nas línguas orais.
Meier (1980) detectou esse uso supergeneralizado observando que, nesse
período, as crianças usam os verbos como pertencentes a uma única classe
verbal na ASL, a classe dos verbos com concordância, chamada por ele de
verbos direcionais (figura 19).
A figura 1 ilustra três
supergeneralizações feitas pela criança. A primeira, com o verbo SPELL, a
segunda, com o verbo LIKE e a última, com o verbo LIKE; em todos os
exemplos foi ilustrada a forma usada pela criança e a forma usada pela
mãe.
Esses três verbos pertencem à classe dos
não flexionados na ASL. A criança direcionou os verbos incorporando o
objeto das sentenças.
Segundo Bellugi, Lillo-Martin, OGrady
& vanHoek (1990), por volta dos 4 anos a concordância verbal ainda
não é utilizada corretamente. Quando as crianças deixam de empilhar os
referentes em um único ponto, elas estabelecem mais de um ponto no
espaço mas de forma inconsistente, pois não estabelecem associações
entre o local e a referência, dificultando a concordância verbal. É
entre 5 e 6 anos que as crianças utilizam os verbos flexionados de forma
adequada.
FIGURA 1: Supergeneralizações na ASL
Observe que nos dois exemplos a criança
está flexionando os verbos que não apresentam essa possibilidade na ASL,
sendo indicada a agramaticalidade através do asterisco. As formas
usadas pela mãe são consideradas gramaticais. Exemplos como esses podem
ser observados na aquisição da LIBRAS.
Loew (1980) analisou o desenvolvimento
da referência em crianças surdas filhas de pais surdos entre 3:1 a 4:6
de idade. A autora apresenta uma síntese da qual foram selecionados os
itens sobre indexação (uso pronominal da apontação e a concordância
verbal) e a estruturação espacial (envolve o estabelecimento de loc) que
são apresentados no quadro 1.
Lillo-Martin (1986) discute alguns
efeitos da modalidade espacial no processo de aquisição. Questiona-se a
iconicidade das línguas de sinais. De fato, alguns sinais e processos na
ASL têm motivação icônica, apresentando alguma relação entre forma e
significado, entre o referente e o referenciado. Lillo-Martin, ao
considerar essa discussão, analisa a seguinte questão: a modalidade de
alguma forma facilita a aquisição da linguagem? Os estudos indicam que,
apesar de haver uma aparente iconicidade nas línguas de sinais, a
aquisição do sistema pronominal e a concordância verbal são considerados
de aquisição tardia, o que é ilustrado pelos estudos mencionados até o
presente momento. Lillo-Martin cita a conclusão de Meier (1981), o qual
diz que a modalidade não facilita a aquisição do sistema da concordância
verbal.
Assim, considerando o input natural que
as crianças surdas analisadas nessas pesquisas apresentam, a aquisição
da ASL parece seguir um curso lingüisticamente similar ao
desenvolvimento das línguas orais.
QUADRO I: Aquisição da indexação e da estruturação espacial na ASL
Na LIBRAS, Quadros (1995) observou que
por volta dos 3 anos e meio ocorre o uso de concordância verbal com
referentes presentes assim como ilustrado em (3).
Com referentes não presentes, houve
algumas ocorrências mas de forma inconsistente, pois o estabelecimento e
a identidade do loc não foram identificados de forma substancial,
conforme é observado nos exemplos em (4).
Em (3) os
foram estabelecidos em locais reais, isto é, o local em que estavam os
referentes no contexto do discurso foi usado para indicar os referentes
sem utilizar a indicação ostensiva. Dessa forma, observou-se que o uso
da concordância verbal está presente, omitindo-se o sujeito e/ou objeto
da sentença. Em (3a) tanto o sujeito como o objeto são nulos.
Em (4a), o sujeito nulo não é
identificado. Nesse tipo de exemplo, a identidade pode ser recuperada
contextualmente. Talvez L estivessse se referindo a sua professora, mas
não se pode afirmar isso, pois o loc não foi previamente estabelecido,
confundindo a identificação do referente. Em (b) a identidade do loc
como ‘papai’ fica óbvia somente porque M a pronunciou após sua
ocorrência; e a identidade do loc de primeira pessoa é adequadamente
identificada, pois envolve o local real de M, a primeira pessoa do
discurso, um referente presente. Os exemplos ilustrados em (3) e (4)
foram coletados em conversas espontâneas das crianças.
Por volta dos 5 anos e meio a 6 anos e
meio, a concordância verbal é usada de forma consistente pelas crianças
adquirindo a LIBRAS. O uso de sujeitos e objetos nulos torna-se comum
nesse período. Também observam-se alguns exemplos com verbos da classe
dos verbos com concordância com sujeitos pronunciados. Isso foi
observado quando as crianças queriam tornar mais clara a identificação
da identidade do loc, assim como ocorre na linguagem adulta. Foram
selecionados alguns exemplos em (5) que ilustram o pronome pronunciado e
a sua omissão durante o discurso.
(5) G (5:11)
Em (5a) a sentença foi retirada de uma
conversa espontânea em que era relatado um fato já ocorrido. Observou-se
o estabelecimento do loc abstrato para "carro", pois "carro" é um
referente não presente no discurso. O exemplo (5b) foi retirado de um
relato de uma das histórias. A criança recontava a história sem o
auxílio do livro para referir-se utilizando as figuras como referentes
presentes; assim, foram estabelecidos loc para "o menino" e para "os
peixes", k’ e k”, respectivamente. A criança introduziu esses loc
primeiro com os nominais e depois utilizou os loc k’ e k” na
concordância verbal. Nesse exemplo o uso do recurso de omitir sujeitos e
objetos foi empregado de forma consistente e adequada.
No relato de histórias, usualmente as
crianças usam as figuras como locais reais dos referentes; isso também é
observado nas narrações dos adultos, conforme mencionado anteriormente.
O estabelecimento de loc com referentes
não presentes no relato das histórias só foi observado no último
período. Foi solicitado a G que recontasse a história sem olhar o livro.
Observou-se que houve o estabelecimento abstrato de loc de forma
bastante consistente. Em (6a) apresenta-se uma sentença em que G
utilizou os loc com os referentes presentes. Em (6b) há uma sentença em
que G utiliza loc estabelecidos com referentes ausentes do contexto do
discurso. As duas sentenças produzidas referem-se à mesma história.
Observa-se em (6) que, quando se trata
de referentes ausentes do discurso, há uma necessidade bem maior de
definir claramente esses referentes no espaço para que não haja
problemas na identificação dos loc. Essa necessidade é devidamente
observada por G. G introduziu os loc de forma adequada, não deixando
dúvidas na identificação dos loc, e omitiu os sujeitos e objetos quando
esses podiam ser adequadamente recuperados pelo receptor.
Algumas Conclusões
Bellugi & Petitto (1988) ao analisar as descobertas na aquisição da linguagem, concluíram que o conhecimento do uso lingüístico do espaço em ASL que uma criança deve ter, necessariamente, inclui a informação quanto as diferenças generalizadas do local de sinalização; o estabelecimento explícito dos nominais em pontos espaciais diferentes; a identificação do local espacial de forma consciente; e, a utilização do local espacial em frases e no discurso de maneira contrastante. As crianças parecem adquirir esse conhecimento por volta dos sete anos, quando atingem a maturidade sobre o sistema referencial da sintaxe.
Elas finalizam a análise afirmando que
os dados sugerem que a criança surda de nascença, com acesso a uma
língua espaço-visual proporcionada por pais surdos, desenvolverá uma
linguagem sem qualquer deficiência . Além disso, os dados apresentados
sugerem que os fundamentos da linguagem não estão baseados na forma do
sinal, mas sim, na função lingüística que a serve.
Todos os estudos mencionados sobre a
aquisição da língua de sinais por crianças surdas concluíram que esse
processo ocorre em período análogo à aquisição de crianças ouvintes.
Bellugi et alli (1990) apresentam
algumas pesquisas que contribuem para educação de surdos e para
compreensão do desenvolvimento da linguagem. Um deles foi feito com
crianças surdas filhas de pais ouvintes, cujo o único meio de
comunicação disponível era o Inglês Sinalizado (sistema artificial que
usa sinais da ASL na ordem do Inglês, sistema equivalente ao Português
Sinalizado no Brasil). Esse estudo investigou o uso do espaço pela
criança. Foi verificado que as crianças, individualmente, transformavam
os conhecimentos que tinham do Inglês Sinalizado quando elas sinalizavam
entre si mesmas, tornando essa sinalização mais especializada. Essa
descoberta indica que a modalidade da língua apresenta efeitos na forma
da língua. Outro estudo realizado com surdos adultos que adquiriram a
língua de sinais em diferentes fases da vida, uns filhos de pais
ouvintes, outros filhos de pais surdos apresentou resultados que sugerem
que, realmente existe um período adequado para o aprendizado da língua.
Ou seja, a aquisição da linguagem é muito melhor quando realizada o
mais precocemente possível.
Considerando o estudo de Quadros (1995)
com crianças surdas filhas de pais surdos sinalizadores da LIBRAS,
pode-se sugerir que os dados analisados na ASL em relação a sintaxe
espacial apresentam uma analogia com os dados analisados na LIBRAS.
Diante disso, sugere-se que o processo de aquisição desses aspectos
observados envolva aspectos universais.
Vale mencionar o trabalho apresentado
por Rodrigues (1993). O autor apresenta uma reflexão sobre a língua de
sinais e sua aquisição por crianças surdas. Ele faz sua análise de um
ponto de vista biológico e chega as seguintes conclusões:
a) se a língua de sinais é organizada no cérebro da mesma forma que as línguas orais (conforme vem sendo demonstrado através de pesquisas), então as línguas de sinais são línguas naturais;
b) se as línguas de sinais são línguas naturais, então seu aprendizado tem período crítico (período ideal para a aquisição da linguagem, após esse período a aquisição é deficiente e, dependendo do caso, impossível);
c) se as línguas de sinais têm período crítico, então as crianças surdas estão iniciando tarde o seu aprendizado; e
d) se a natureza compensa parcialmente a falta de audição, aumentando a capacidade visual dos surdos (conforme pesquisas realizadas há uma competição entre os estímulos acústicos e visuais), então está sendo ignorada a maior habilidade dos surdos quando lhes é imposta uma língua oral, ao invés da língua de sinais.
a) se a língua de sinais é organizada no cérebro da mesma forma que as línguas orais (conforme vem sendo demonstrado através de pesquisas), então as línguas de sinais são línguas naturais;
b) se as línguas de sinais são línguas naturais, então seu aprendizado tem período crítico (período ideal para a aquisição da linguagem, após esse período a aquisição é deficiente e, dependendo do caso, impossível);
c) se as línguas de sinais têm período crítico, então as crianças surdas estão iniciando tarde o seu aprendizado; e
d) se a natureza compensa parcialmente a falta de audição, aumentando a capacidade visual dos surdos (conforme pesquisas realizadas há uma competição entre os estímulos acústicos e visuais), então está sendo ignorada a maior habilidade dos surdos quando lhes é imposta uma língua oral, ao invés da língua de sinais.
Introdução à Gramática da LIBRAS
O Universal nas Línguas
Pesquisas sobre as línguas de sinais vêm mostrando que estas línguas são comparáveis em complexidade e expressividade a quaisquer línguas orais. Estas línguas expressam idéias sutis, complexas e abstratas. Os seus usuários podem discutir filosofia, literatura ou política, além de esportes, trabalho, moda e utilizá-la com função estética para fazer poesias, estórias, teatro e humor.
Como toda língua, as línguas de sinais
aumentam seus vocabulários com novos sinais introduzidos pelas
comunidades surdas em resposta à mudanças culturais e tecnológicas.
As línguas de sinais não são universais,
cada língua de sinais tem sua própria estrutura gramatical. Assim, como
as pessoas ouvintes em países diferentes falam diferentes línguas,
também as pessoas surdas por toda parte do mundo, que estão inseridos em
“Culturas Surdas”, possuem suas próprias línguas, existindo portanto
muitas línguas de sinais diferentes, como: Língua de Sinais Francesa,
Chilena, Portuguesa, Americana, Argentina, Venezuelana, Peruana,
Portuguesa, Inglesa, Italiana, Japonesa, Chinesa, Uruguaia, Russa,
Urubus-Kaapor, citando apenas algumas. Estas línguas são diferentes uma
das outras e independem das línguas orais-auditivas utilizadas nesses e
em outros países, por exemplo: o Brasil e Portugal possuem a mesma
língua oficial, o português, mas as línguas de sinais destes países são
diferentes, o mesmo acontece com os Estados Unidos e a Inglaterra, entre
outros.
Também pode acontecer que uma mesma
língua de sinais seja utilizada por dois países, como é o caso da língua
de sinais americana que é usada pelos surdos dos Estados Unidos e do
Canadá.
Embora, surdos de países com línguas de
sinais diferentes comunicam-se mais rapidamente uns com os outros, fato
que não ocorre entre falantes de línguas orais, que necessitam de um
tempo bem maior para um entendimento. Isso se deve à capacidade que as
pessoas surdas têm em desenvolver e aproveitar gestos e pantomimas para a
comunicação e estarem atentos as expressões faciais e corporais das
pessoas.
A Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) é
a língua de sinais utilizada pelos surdos que vivem em cidades do
Brasil onde existem comunidades surdas, mas além dela, há registros de
uma outra língua de sinais que é utilizada pelos índios Urubus-Kaapor na
Floresta Amazônica.
A LIBRAS, como toda língua de sinais, é
uma língua de modalidade gestual-visual porque utiliza, como canal ou
meio de comunicação, movimentos gestuais e expressões faciais que são
percebidos pela visão; portanto, diferencia da Língua Portuguesa, que é
uma língua de modalidade oral-auditiva por utilizar, como canal ou meio
de comunicação, sons articulados que são percebidos pelos ouvidos. Mas
as diferenças não estão somente na utilização de canais diferentes,
estão também nas estruturas gramaticais de cada língua.
Embora com as diferenças peculiares a
cada língua, todas as línguas possuem algumas semelhanças que a
identificam como língua e não linguagem como, por exemplo, a linguagem
das abelhas, dos golfinhos, dos macacos, enfim, a comunicação dos
animais.
Uma semelhança entre as línguas é que
todas são estruturadas a partir de unidades mínimas que formam unidades
mais complexas, ou seja, todas possuem os seguintes níveis lingüísticos:
o fonológico, o morfológico, o sintático, o semântico e o pragmático.
No nível fonológico, as línguas são
formadas de fonemas. Os fonemas só têm valor contrastivo, não têm
significado mas, a partir das regras de cada língua, se combinam para
formar os morfemas e estes as palavras.
Na língua portuguesa, os fonemas I m I I n I I s I I a I I e I I i I podem se combinar e formar a palavra I meninas I.
No nível morfológico, esta palavra é formada pelos morfemas {menin-} {-a} {-s}.
Diferentemente dos fonemas, cada um
destes morfemas tem um significado: {menin-} é o radical desta palavra e
significa “criança”, o morfema {-a} significa “gênero feminino” e o
morfema {-s} significa “plural”.
No nível sintático, esta palavra pode se
combinar com outras para formar a frase, que precisa ter um sentido em
coerência com o significado das palavras em um contexto, o que
corresponde aos níveis semântico (significado) e pragmático (sentido no
contexto: onde está sendo usada) respectivamente.
Outra semelhança entre as línguas é que
os usuários de qualquer língua podem expressar seus pensamentos
diferentemente por isso uma pessoa que fala uma determinada língua a
utiliza de acordo com o contexto: o modo de se falar com um amigo não é
igual ao de se falar com uma pessoa estranha. Isso é o que se chama de
registro. Quando se aprende uma língua está aprendendo também a
utilizá-la a partir do contexto.
Outra semelhança também é que todas as
línguas possuem diferenças quanto ao seu uso em relação à região, ao
grupo social, à faixa etária e ao sexo. O ensino oficial de uma língua
sempre trabalha com a norma culta, a norma padrão, que é utilizada na
forma escrita e falada e sempre toma alguma região e um grupo social
como padrão.
Ao se atribuir às línguas de sinais o
status de língua é porque elas, embora sendo de modalidade diferente,
possuem também estas características em relação às diferenças regionais,
sócio-culturais, entre outras, e em relação às suas estruturas que
também são compostas pelos níveis descritos acima.
O Sinal e seus Parâmetros
O que é denominado de palavra ou item lexical nas línguas orais-auditivas, são denominados sinais nas línguas de sinais.
O sinal é formado a partir da combinação
do movimento das mãos com um determinado formato em um determinado
lugar, podendo este lugar ser uma parte do corpo ou um espaço em frente
ao corpo. Estas articulações das mãos, que podem ser comparadas aos
fonemas e às vezes aos morfemas, são chamadas de parâmetros, portanto,
nas línguas de sinais podem ser encontrados os seguintes parâmetros:
1. configuração das mãos: são formas das
mãos, que podem ser da datilologia (alfabeto manual) ou outras formas
feitas pela mão predominante (mão direita para os destros), ou pelas
duas mãos do emissor ou sinalizador. Os sinais APRENDER, LARANJA e
ADORAR têm a mesma configuração de mão;
2. ponto de articulação: é o lugar onde
incide a mão predominante configurada, podendo esta tocar alguma parte
do corpo ou estar em um espaço neutro vertical (do meio do corpo até à
cabeça) e horizontal (à frente do emissor). Os sinais TRABALHAR,
BRINCAR, CONSERTAR são feitos no espaço neutro e os sinais ESQUECER,
APRENDER e PENSAR são feitos na testa;
3. movimento: os sinais podem ter um
movimento ou não. Os sinais citados acima tem movimento, com exceção de
PENSAR que, como os sinais AJOELHAR, EM-PÉ, não tem movimento;
4. orientação: os sinais podem ter uma
direção e a inversão desta pode significar idéia de oposição, contrário
ou concordância número-pessoal, como os sinais QUERER E QUERER-NÃO; IR e
VIR;
5. Expressão facial e/ou corporal:
muitos sinais, além dos quatro parâmetros mencionados acima, em sua
configuração tem como traço diferenciador também a expressão facial e/ou
corporal, como os sinais ALEGRE e TRISTE. Há sinais feitos somente com a
bochecha como LADRÃO, ATO-SEXUAL.
Na combinação destes quatro parâmetros,
ou cinco, tem-se o sinal. Falar com as mãos é, portanto, combinar estes
elementos que formam as palavras e estas formam as frases em um
contexto.
Para conversar, em qualquer língua, não
basta conhecer as palavras, é preciso aprender as regras de combinação
destas palavras em frases.
Sistema de Transcrição para a LIBRAS
As
línguas de sinais tem características próprias e por isso vem sendo
utilizado mais o vídeo para sua reprodução à distância. Existem sistemas
de convenções para escrevê-las, mas como geralmente eles exigem um
período de estudo para serem aprendidos, neste curso, estamos utilizando
um "Sistema de notação em palavras".
Este sistema, que vem sendo adotado por
pesquisadores de línguas de sinais em outros países e aqui no Brasil,
tem este nome porque as palavras de uma língua oral-auditiva são
utilizadas para representar aproximadamente os sinais.
Assim, a LIBRAS será representada a partir das seguintes convenções:
1. Os sinais da LIBRAS, para efeito de
simplificação, serão representados por itens lexicais da Língua
Portuguesa (LP) em letras maiúsculas. Exemplos: CASA, ESTUDAR, CRIANÇA,
etc;
2. um sinal, que é traduzido por duas ou
mais palavras em língua portuguesa, será representado pelas palavras
correspondentes separadas por hífen. Exemplos: CORTAR-COM-FACA,
QUERER-NÃO "não querer", MEIO-DIA, AINDA-NÃO, etc;
3. um sinal composto, formado por dois
ou mais sinais, que será representado por duas ou mais palavras, mas com
a idéia de uma única coisa, serão separados pelo símbolo ^ . Exemplos:
CAVALO^LISTRA “zebra”;
4. a datilologia ( alfabeto manual), que
é usada para expressar nome de pessoas, de localidades e outras
palavras que não possuem um sinal, está representada pela palavra
separada, letra por letra por hífen. Exemplos: J-O-Ã-O,
A-N-E-S-T-E-S-I-A;
5. o sinal soletrado, ou seja, uma
palavra da língua portuguesa que, por empréstimo, passou a pertencer à
LIBRAS por ser expressa pelo alfabeto manual com uma incorporação de
movimento próprio desta língua, está sendo representado pela datilologia
do sinal em itálico. Exemplos: R-S “reais”, A-C-H-O, QUM “quem”,
N-U-NC-A, etc;
6. na LIBRAS não há desinências para
gêneros (masculino e feminino) e número (plural), o sinal, representado
por palavra da língua portuguesa que possui estas marcas, está terminado
com o símbolo @ para reforçar a idéia de ausência e não haver confusão.
Exemplos: AMIG@ “amiga(s) e amigo(s)” , FRI@ “fria(s) e frio(s)”, MUIT@
“muita(s) e muito(s)”, TOD@, “toda(s) e todo(s)”, EL@ “ela(s), ele(s)”,
ME@ “minha(s) e meu(s)” etc;
7. Os traços não-manuais: expressões
facial e corporal, que são feitos simultaneamente com um sinal, estão
representados acima do sinal ao qual está acrescentando alguma idéia,
que pode ser em relação ao:
a) tipo de frase ou advérbio de modo: interrogativa ou... i ... negativa ou ... neg ... etc
Para simplificação, serão utilizados, para a representação de frases nas formas exclamativas e interrogativas, os sinais de pontuação utilizados na escrita das línguas orais-auditivas, ou seja: !, ? e ?!
b) advérbio de modo ou um intensificador: muito rapidamente exp.f "espantado" etc;
Para simplificação, serão utilizados, para a representação de frases nas formas exclamativas e interrogativas, os sinais de pontuação utilizados na escrita das línguas orais-auditivas, ou seja: !, ? e ?!
b) advérbio de modo ou um intensificador: muito rapidamente exp.f "espantado" etc;
9. os verbos que possuem concordância
de lugar ou número-pessoal, através do movimento direcionado, estão
representados pela palavra correspondente com uma letra em subscrito
que indicará:
a) a variável para o lugar: i = ponto próximo à 1a pessoa,
j = ponto próximo à 2a pessoa,
e k´ = pontos próximos à 3a pessoas,
e = esquerda,
d = direita;
10. Às vezes há uma marca de plural pela
repetição do sinal. Esta marca será representada por uma cruz no lado
direto acima do sinal que está sendo repetido:
Exemplo: GAROTA +
11. quando um sinal, que geralmente é feito somente com uma das mãos, ou dois sinais estão sendo feitos pelas duas mãos simultaneamente, serão representados um abaixo do outro com indicação das mãos: direita (md) e esquerda (me).
Estas convenções vem sendo utilizadas
para poder representar, linearmente, uma língua espaço-visual, que é
tridimensional. Felipe (1988, 1991,1993,1994,1995,1996)
Os Processos de Formação de Palavras na LIBRAS
Os livros sobre as gramáticas das línguas geralmente trazem uma parte sobre os processos de formação de palavras.
Na LIBRAS, os sinais são formados a
partir da: configuração de mãos, movimento, orientação e ponto de
articulação, estes parâmetros já foram mencionados na Introdução deste
curso.
Estes quatro parâmetros podem ser
comparados a “pedacinhos” de um sinal porque às vezes eles têm
significados e, através de alterações em suas combinações, eles formam
os sinais. Portanto:
a) a configuração de mãos, pode ser um marcador de gênero (animado: pessoa e animais / inanimado: coisas). Exemplo:
b) o ponto de articulação pode ser uma marca de concordância verbal com o advérbio de lugar. Exemplo:
c) o movimento pode ser uma raiz. Exemplos:
IR, VIR, BRINCAR.
A alteração na freqüência do movimento, pode ser uma marca de aspecto temporal:
TRABALHAR-CONTINUAMENTE; de modo: FALAR-DEMASIADAMENTE, ou um intensificador: TRABALHAR-MUITO;
d) a orientação pode ser uma concordância número-pessoal. Exemplos:
Fazendo um paralelo destes parâmetros
que, às vezes, como foi mostrado, podem ter um significado, com alguns
fonemas da língua portuguesa, que podem também ter um significado,
teremos:
(1) os artigos definidos: a e o. Exemplos: a menina, o menino;
(2) , as desinências de gênero e plural. Exemplos: menina, casas.
(2) , as desinências de gênero e plural. Exemplos: menina, casas.
Na LIBRAS, portanto, os processos de formação de palavras podem ocorrem através de:
1. Modificações por adição à raiz:
uma raiz pode ser modificada através da adição de afixos. Por exemplo, a
incorporação da negação é um processo de modificação por adição à raiz
porque,
· como sufixo, ela se incorpora em
alguns verbo: a raiz, que possui um determinado movimento em um primeiro
momento, finaliza-se com um movimento contrário, que caracteriza a
negação incorporada; como nos verbos: QUERER / QUERER-NÃO; GOSTAR /
GOSTAR-NÃO;
· como infixo, ela se incorpora simultaneamente `a raiz através do movimento ou expressão corporal: TER / TER-NÃO; PODER / PODER-NÃO.
· como infixo, ela se incorpora simultaneamente `a raiz através do movimento ou expressão corporal: TER / TER-NÃO; PODER / PODER-NÃO.
A negação, além de poder ocorrer através
destes processos morfológicos, pode também ocorrer sintaticamente
porque, através dos advérbios ‘NÃO’ E ‘NADA’, pode-se construir uma
frase negativa, como no exemplo: EU INGLÊS SABER NÃO, ENTENDER NADA “eu
não sei inglês, não entendo nada”.
Há, ainda, a incorporação do intensificador: “muito” ou de advérbios de modo, que alteram, também, o movimento da raiz.
2. Modificação interna da raiz: uma raiz pode ser modificada por três tipos de acréscimo:
a) o da flexão que, através da
direcionalidade, marca as pessoas do discurso, fazendo com que a raiz se
inverta ou até adquira uma forma em arco ;
b) o acréscimo do aspecto verbal que, através de mudanças na freqüência do movimento da raiz marcam os aspectos durativo, contínuo, etc;
c) o acréscimo de um marcador de concordância de gênero que, através de configurações de mãos (classificadores), especifica a coisa: objeto plano vertical/horizontal, redondo, etc
b) o acréscimo do aspecto verbal que, através de mudanças na freqüência do movimento da raiz marcam os aspectos durativo, contínuo, etc;
c) o acréscimo de um marcador de concordância de gênero que, através de configurações de mãos (classificadores), especifica a coisa: objeto plano vertical/horizontal, redondo, etc
3. Processos de derivação Zero: na LIBRAS, como a língua inglesa, há muitos verbos denominais ou substantivos verbais que são invariáveis e somente no contexto pode-se perceber se estão sendo utilizados com a função de verbos ou de nome.
Exemplos: AVIÃO / IR-DE-AVIÃO; CADEIRA /
SENTAR; FERRO / PASSAR-COMFERRO; PORTA / ABRIR-PORTA; BRINCADEIRA /
BRINCAR; TESOURA / CORTAR-COM-TESOURA; BICICLETA / ANDAR-DE-BICICLETA;
CARRO / DIRIGIRCARRO; VIDA / VIVER, etc.
Alguns destes pares, quando possuem uma
marca de concordância com o objeto, apresentam uma estrutura OiVi , como
o verbo CORTAR-COM-TESOURA; ou apresentam uma diferença em relação ao
parâmetro movimento, como os verbos IRDE-AVIÃO, que apresenta um
movimento mais alongado, em relação ao substantivo AVIÃO, e
PASSAR-COM-FERRO, que apresenta um movimento mais repetido e alongado,
em oposição ao movimento repetido e retido para o nome FERRO.
4. Processos de composição:
neste processo de formação de palavra duas ou mais raízes se combinam e
dão origem a uma outra forma, um outro sinal. Exemplos:
CAVALO^LISTRA-PELO-CORPO “zebra” ; MULHER^BEIJO-NA-MÃO “mãe”
CASA^ESTUDAR “escola”; CASAR^SEPARAR “divorciar”; COMER^MEIO-DIA
“almoço”; etc.
Pode-se concluir do exposto que,
independentemente da modalidade de língua, as categorias gramaticais e
os processos de formação de palavras de uma determinada língua apontarão
para a sua classificação enquanto língua de um determinado tipo, a
partir de seus processos mais produtivos.
As Categorias Gramaticais na LIBRAS
As
categorias gramaticais ou parte do discurso são os paradigmas ou
classes de palavras de uma língua. Todas língua possui palavras que são
classificadas como fazendo parte de um tipo, classe ou paradigma em
relação as seus aspectos morfológicos, sintáticos, semânticos e
pragmáticos. Assim, na língua portuguesa, por exemplo, os substantivos
são palavras que possuem desinência de gênero e número, são as
palavras-chave de um sintagma nominal que pode ter a função de sujeito
ou de objeto.
Embora todas as línguas não possuam as
mesmas classes gramaticas e muitas línguas não possuem algumas, isso não
implica carência ou inferioridade, as línguas tem formas diferenciadas
para expressar os conceitos. Por exemplo, na LIBRAS não há artigos, em
inglês somente este uma forma para para artigo definido: “the”.
As outras categorias, que existem na
língua portuguesa, também existem na LIBRAS. Aqui serão apresentadas
algumas e estudos mais aprofundados destas e de outras, que não serão
mencionadas, já estão sendo feitos:
Verbo na LIBRAS
Basicamente na LIBRAS, há dois tipos de verbo:
a) verbos que não possuem marca de concordância, embora possam ter flexão para aspecto verbal;
b) verbos que possuem marca de concordância.
b) verbos que possuem marca de concordância.
Quando se faz uma frase com verbos do primeiro grupo, é como se eles ficassem no infinitivo, por exemplo:
(1) EU TRABALHAR FENEIS “eu trabalho na FENEIS”;
(2)EL@ TRABALHAR FENEIS “ele/a trabalha na FENEIS”;
(3) EL@ TRABALHAR FENEIS “eles/as trabalham na FENEIS.
(2)EL@ TRABALHAR FENEIS “ele/a trabalha na FENEIS”;
(3) EL@ TRABALHAR FENEIS “eles/as trabalham na FENEIS.
Os verbos do segundo grupo podem ser subdivididos em:
1. Verbos que possuem concordância
número-pessoal: a orientação marca as pessoas do discurso. O ponto
inicial concorda com o sujeito e o final com o objeto. Exemplos:
2. Verbos que possuem concordância de
gênero: são verbos classificadores porque a eles estão incorporados,
através da configuração de mão, uma concordância de gênero: PESSOA,
ANIMAL ou COISA. Exemplos:
3. Verbos que possuem concordância com a
localização: são verbos que começam ou terminam em um determinado lugar
que se refere ao lugar de uma pessoa, coisa, animal ou veículo, que
está sendo colocado, carregado, etc. Portanto o ponto de articulação
marca a localização. Exemplos:
Estes tipos de concordância podem
coexistir em um mesmo verbo. Assim, há verbos que possuem concordância
de gênero e localização, como o verbo COLOCAR acima; e concordância
número-pessoal e de gênero, como o verbo DAR. Concluindo, pode-se
esquematizar o sistema de concordância verbal, na LIBRAS, da seguinte
maneira:
Classificador na LIBRAS
Nas línguas do mundo as classificações podem se manifestam de várias formas.
Podem ser:
· uma desinência, como em português, que classifica os substantivos e os adjetivos em masculino e feminino: menina - menino;
· pode ser uma partícula que se coloca entre as palavras;
· e ainda pode ser uma desinência que se coloca no verbo para estabelecer concordância.
· pode ser uma partícula que se coloca entre as palavras;
· e ainda pode ser uma desinência que se coloca no verbo para estabelecer concordância.
Ao se atribuir uma qualidade a uma coisa
como, por exemplo: arredondada, quadrado, cheio de bolas, de listras,
etc isso representa um tipo de classificação porque é uma adjetivação
descritiva, mas isso não quer dizer que seja, necessariamente, um
classificador como se vem trabalhando este conceito nos estudos
lingüísticos.
Para os estudiosos deste assunto, um
classificador é uma forma que existe em número restrito em uma língua e
estabelece um tipo de concordância.
Na LIBRAS, os classificadores são
configurações de mãos que, relacionadas à coisa, pessoa e animal,
funcionam como marcadores de concordância.
Assim, na LIBRAS, os classificadores são
formas que, substituindo o nome que as precedem, pode vir junto ao
verbo para classificar o sujeito ou o objeto que está ligado à ação do
verbo. Portanto os classificadores na LIBRAS são marcadores de
concordância de gênero: PESSOA, ANIMAL, COISA.
Os classificadores para PESSOA e ANIMAL
podem ter plural, que é marcado ao se representar duas pessoas ou
animais simultaneamente com as duas mãos ou fazendo um movimento
repetido em relação ao número.
Os classificadores para COISA
representam, através da concordância, uma característica desta coisa que
está sendo o objeto da ação verbal, exemplos:
Não se deve confundir os
classificadores, que são algumas configurações de mãos incorporadas ao
movimento de certos tipos de verbos, com os adjetivos descritivos que,
nas línguas de sinais, por estas serem espaço-visuais, representam
iconicamente qualidades de objetos. Por exemplo, para dizer nestas
línguas que “uma pessoa está vestindo uma blusa de bolinhas,
quadriculada ou listrada”, estas expressões adjetivas serão desenhadas
no peito do emissor, mas esta descrição não é um classificador, e sim um
adjetivo que, embora classifique, estabelece apenas uma relação de
qualidade do objeto e não relação de concordância de gênero: PESSOA,
ANIMAL, COISA, que é a característica dos classificadores na LIBRAS,
como também em outras línguas orais e de sinais.
Advérbios de tempo
Na LIBRAS não há marca de tempo nas formas verbais, é como se os verbos ficassem na frase quase sempre no infinitivo. O tempo é marcado sintaticamente através de advérbios de tempo que indicam se a ação está ocorrendo no presente:
HOJE, AGORA; ocorreu no passado: ONTEM,
ANTEONTEM; ou irá ocorrer no futuro: AMANHÃ. Por isso os advérbios
geralmente vem no começo da frase, mas podem ser usados também no final.
Para um tempo verbal indefinido, usa-se os sinais:
· HOJE, que traz a idéia de “presente”;
· PASSADO, que traz a idéia de “passado”;
· FUTURO, que traz a idéia de futuro.
· PASSADO, que traz a idéia de “passado”;
· FUTURO, que traz a idéia de futuro.
Adjetivo na LIBRAS
Os adjetivos são sinais que formam uma
classe específica na LIBRAS e sempre estão na forma neutra, não havendo,
portanto, nem marca para gênero (masculino e feminino), em para número
(singular e plural).
Muitos adjetivos, por serem descritivos e
classificadores, apresentam iconicamente uma qualidade do objeto,
desenhando-a no ar ou mostrando-a a partir do objeto ou do corpo do
emissor.
Em português, quando uma pessoa se
refere a um objeto como sendo arredondado, quadrado, listrados, etc
está, também, descrevendo e classificando, mas na LIBRAS esse processo é
mais “transparente” porque o formato ou textura são traçados no espaço
ou no corpo do emissor, em uma tridimensionalidade permitida pela
modalidade da língua.
Em relação à colocação dos adjetivos na frase, eles geralmente vêm após o substantivo que qualifica. Exemplos:
(14) PASSADO EU GORD@ MUITO-COMER, AGORA EU MAGR@ EVITAR COMER
(15) LEÃ@ COR CORPO AMAREL@ PERIGOS@
(16) RAT@ PEQUEN@, COR PRET@, ESPERT@
(15) LEÃ@ COR CORPO AMAREL@ PERIGOS@
(16) RAT@ PEQUEN@, COR PRET@, ESPERT@
Comparativo de igualdade, superioridade e inferioridade
Em LIBRAS, também, pode ser comparada uma qualidade a partir de três situações: superioridade, inferioridade e igualdade.
Para se fazer os comparativos de
superioridade e inferioridade, usa-se os sinais MAIS ou MENOS antes do
adjetivo comparado, seguido da conjunção comparativa DO-QUE, ou seja:
· comparativo de superioridade: X MAIS ------- DO-QUE Y;
· comparativo de inferioridade: X MENOS ---- DO-QUE Y.
· comparativo de inferioridade: X MENOS ---- DO-QUE Y.
Para o comparativo de igualdade, podem ser usados dois sinais: IGUAL (dedos indicadores e médios das duas mãos roçando um no outro) e IGUAL (duas mãos em B, viradas para frente encostadas lado a lado), geralmente no final da frase. Exemplos:
(17) VOCÊ MAIS VELH@ DO-QUE EL@
(18) VOCÊ MENOS VELH@ DO-QUE EL@
(19) VOCÊ-2 BONIT@ IGUAL (me) IGUAL (md)
Pronome na LIBRAS
Pronomes pessoais
A LIBRAS possui um sistema pronominal para representar as pessoas do discurso:
· primeira pessoa (singular, dual, trial, quatrial e plural): EU; NÓS-2, NóS-3, NÓS-4, NÓSGRUPO, NÓS-TOD@;
· segunda pessoa (singular, dual, trial, quatrial e plural): VOCÊ, VOCÊ-2, VOCÊ-3, VOCÊ-4, VOCÊ-GRUPO, VOCÊ-TOD@;
· terceira pessoa (singular, dual, trial, quatrial e plural): EL@, EL@-2, EL@-3, EL@-4, EL@- GRUPO, EL@-TOD@
· segunda pessoa (singular, dual, trial, quatrial e plural): VOCÊ, VOCÊ-2, VOCÊ-3, VOCÊ-4, VOCÊ-GRUPO, VOCÊ-TOD@;
· terceira pessoa (singular, dual, trial, quatrial e plural): EL@, EL@-2, EL@-3, EL@-4, EL@- GRUPO, EL@-TOD@
No singular, o sinal para todas as pessoas é o mesmo, ou seja, a configuração da mão predominante é em “d” ( dedo indicador estendido, veja alfabeto manual), o que difere uma das outras é a orientação da mão: o sinal para “eu” é um apontar para o peito do emissor (a pessoa que está falando), o sinal para “você” é um apontar para o receptor (a pessoa com quem se fala) e o sinal para “ele/ela” é um apontar para uma pessoa que não está na conversa ou para um lugar convencionado para uma terceira pessoa que está sendo mencionada.
No dual, a mão ficará com o formato de
dois, no trial o formato será de três, no quatrial o formato será de
quatro e no plural há dois sinais: um sinal composto formado pelo sinal
para a respectiva pessoa do discurso, no singular, mais o sinal GRUPO; e
outro sinal para plural que é feito pela mão predominante com a
configuração em “d” fazendo um círculo.
Como na língua portuguesa, na LIBRAS,
quando uma pessoa surda está conversando, ela pode omitir a primeira
pessoa e a segunda porque, pelo contexto, as pessoas que estão
interagindo sabem a qual das duas o verbo está relacionado, por isso,
quando estas pessoas estão sendo utilizadas pode ser para dar ênfase à
frase.
Quando se quer falar sobre uma terceira
pessoa que está presente, mas deseja-se uma certa reserva, por educação,
não se aponta para esta pessoa diretamente. Nesta situação, o emissor
faz um sinal com os olhos e um leve movimento de cabeça para a direção
da pessoa que está sendo mencionada, ou aponta para a palma da mão
encontrando o dedo na mão um pouco à frente do peito do emissor, estando
esta mão voltada para a direção onde se encontra a pessoa referida.
Pronomes demonstrativos e advérbios de lugar
Na LIBRAS os pronomes demonstrativos e os advérbios de lugar têm o mesmo sinal, somente o contexto os diferencia pelo sentido da frase acompanhada de expressão facial.
Este tipo de pronome e de advérbio estão
relacionados às pessoas do discurso e representam, na perspectiva do
emissor, o que está bem próximo, perto e distante.
Estes pronomes ou advérbios têm a mesma
configuração de mãos dos pronomes pessoais (mão em d), mas os pontos de
articulação e as orientações do olhar são diferentes.
Assim, EST@ / AQUI é um apontar para o
lugar perto e em frente do emissor, acompanhado de um olhar para este
ponto; ESS@ / AÍ é um apontar para o lugar perto e em frente do
receptor, acrescido de um olhar direcionado não para o receptor , mas
para o ponto apontado perto segunda pessoa do discurso; e AQUELE / LÁ é
um apontar para um lugar mais distante, o lugar da terceira pessoa, mas
diferentemente do pronome pessoal, ao apontar para este ponto há um
olhar direcionado:
Como os pronomes pessoais, os pronomes
demonstrativos também não possuem marca para gêneros masculino e
feminino e, por isso, está ausência, ou neutralidade, está sendo
assinalada pelo símbolo @.
Pronomes possessivos
Os pronomes possessivos, como os pessoais e demonstrativos, também não possuem marca para gênero e estão relacionados às pessoas do discurso e não à coisa possuída, como acontece em português:
· EU => ME@ SOBRINH@;
· VOCÊ => TE@ ESPOS@;
· EL@ => SE@.FILH@
· VOCÊ => TE@ ESPOS@;
· EL@ => SE@.FILH@
Para a primeira pessoa: ME@, pode haver
duas configurações de mão: uma é a mão aberta com os dedos juntos, que
bate levemente no peito do emissor; a outra é a configuração da mão em P
com o dedo médio batendo no peito.
Para as segunda e terceira pessoas, a
mão tem esta segunda configuração em P, mas o movimento é em direção à
pessoa referida: segunda ou terceira.
Não há sinal específico para os pronomes
possessivo no dual, trial, quadrial e plural (grupo), nestas situações
são usados os pronomes pessoais correspondentes.
Exemplo: NÓS FILH@ “nosso(a) filho(a)”
Pronomes Interrogativos
QUE, QUEM, ONDE
Os pronomes interrogativos QUE e QUEM geralmente são usados no início da frase, mas o pronome interrogativo ONDE e o pronome QUEM, quando está sendo usado com o sentido de “quem-é” ou “de quem é” são mais usados no final. Todos os três sinais têm uma expressão facial interrogativa feita simultaneamente com eles.
O pronome interrogativo QUEM, dependendo
do contexto, tem duas formas diferentes, os sinais QUEM e o sinal
soletrado QUM. Se se quer perguntar “quem está tocando a campainha”,
usa-se o sinal QUEM; se quer perguntar “quem faltou hoje” ou “quem está
falando” ou ainda “quem fez isso”, usa-se o sinal soletrado QUM, como
nos exemplos abaixo:
QUAL, COMO, PARA-QUE e POR-QUE
Na LIBRAS, há uma tendência para a utilização, no final da frase, dos pronomes interrogativos QUAL, COMO e PARA-QUE, e para a utilização, no início da frase, do pronome interrogativo POR-QUE, mas os primeiros podem ser usados também no início e POR-QUE pode ser utilizado também no final.
Não há diferença entre o “por que”
interrogativo e o “porque” explicativo, o contexto mostra, pelas
expressões facial e corporal, quando ele está sendo usado em frase
interrogativa ou em frase explicativa à pergunta.O pronome interrogativo
COMO também tem outra forma em datilologia:
C-O-M-O. Exemplos:
· QUAL?
(22) BLUSA MAIS BONIT@. ESTAMPAD@ OU LIS@ QUAL? MAIS BONIT@ ESTAMPAD@.
(23) VOCÊ LER LIVRO? QUAL NOME? NOME “ VENDO VOZES”
· COMO?
(24) VOCÊ IR PRAIA AMANHÃ CARRO ÔNIBUS A-PÉ? COMO? CARRO. VOCÊ QUER IR-JUNTO?
(25) EL@ COMPRAR CARRO? C-O-M-O TER DINHEIRO? EL@ GANHAR LOTO
· PARA-QUE?
(26) FALAR M-L EL@ PRA-QUE? PORQUE EU GOSTAR-NÃO EL@
(27) CHEGAR ATRASAD@ , VOCÊ BEBER? NÃO, PENSAR M-L! PRA-QUE? BOBAGEM! exp.facial “parece que ele percebeu, me dei mal!!
· POR-QUE?
...interrog...
(28) POR-QUE FALTAR ONTEM TRABALHAR? POR-QUE ESTAR DOENTE.
QUANDO, DIA, QUE-HORA, QUANTAS-HORAS
· QUANDO e DIA
Sempre simultaneamente aos pronomes ou
expressões interrogativas há uma expressão facial indicando que a frase
está na forma interrogativa.
A pergunta com QUANDO está relacionada a
um advérbio de tempo na resposta ou a um dia específico. Por isso há
três sinais diferentes para “quando”. Um que especifica passado:
QUANDO-PASSADO ( palma da mão com um movimento para o corpo do emissor),
outro que especifica futuro: QUANDO-FUTURO (palma da mão com um
movimento para fora do corpo do emissor), e outro que especifica o dia:
DIA.
Exemplos:
Na LIBRAS, para se referir a horas,
usa-se a mesma configuração dos numerais para quantidade e, após doze
horas, não se continua a contagem, começa-se a contar novamente: 1 HORA,
2 HORA, 3 HORA, etc, acrescentando o sinal TARDE, quando necessário,
porque geralmente pelo contexto já se sabe se está se referindo à manhã,
tarde, noite ou madrugada.
A expressão interrogativa QUE-HORAS? (um apontar para o pulso), está relacionada ao tempo cronológico, exemplo:
(32) QUE-HORAS
· AULA COMEÇAR QUE-HORAS AQUI?
· VOCÊ TRABALHAR COMEÇAR QUE-HORAS?
· AULA TERMINAR QUE-HORAS?
· VOCÊ ACORDAR QUE-HORAS?
· VOCÊ DORMIR QUE-HORAS?
· VOCÊ TRABALHAR COMEÇAR QUE-HORAS?
· AULA TERMINAR QUE-HORAS?
· VOCÊ ACORDAR QUE-HORAS?
· VOCÊ DORMIR QUE-HORAS?
Já a expressão interrogativa
QUANTAS-HORAS ( um círculo ao redor do rosto) está sempre relacionada ao
tempo gasto para se realizar alguma atividade, exemplos: interrogativo
(33) QUANTAS-HORAS
· VIAJAR SÃO-PAULO QUANTAS-HORAS?
· TRABALHAR ESCOLA QUANTAS-HORAS?
· Expressões idiomáticas relacionadas ao ano sideral
· TRABALHAR ESCOLA QUANTAS-HORAS?
· Expressões idiomáticas relacionadas ao ano sideral
Na LIBRAS há 2 sinais diferentes para a
idéia “dia”: um sinal relacionado a dia do mês, que é a datilologia
D-I-A, e o sinal DIA (duração), (que tem a configuração de mão em d,
batendo na testa no lado direito) Exemplos:
(34) D-I-A AMANHÃ?
AMANHÃ D-I-A 17
(35) VIAJAR RECIFE ÔNIBUS EU CANSAD@ DIA-2
“Eu estou cansada porque viajei 2 dias de ônibus para o Recife”
“Eu estou cansada porque viajei 2 dias de ônibus para o Recife”
Os numerais de 1 a 4 podem ser incorporados aos sinais DIA (duração), SEMA-NA, MÊS e ANO e VEZ, exemplos:
(36) DIA-1, DIAS-2;
(37) SEMANA-1, SEMANA-2, SEMANA-3, SEMANA-4;
(38) MÊS-1, MÊS-2, MÊS-3;
(39) ANO-1, AN0-2, ANO-3;
(40) VEZ-1, VEZ-2, VEZ-3, MUIT@-VEZES
A partir do numeral 5, não há mais
incorporação e a construção utilizada é formada pelo sinal seguido do
numeral segue. Esta construção também pode ser usada para os numerais
inferiores a 5, que permitem a incorporação mencionada acima, exemplos:
(41) DIA 4, DIA 20, SEMANA 8, ANO 6
Aos sinais DIA (duração) e SEMANA podem
ser incorporadas a freqüência ou duração através de um movimento
prolongado ou repetido. Exemplos:
(42) TODOS-OS-DIAS - movimento repetido;
(43) DIA-INTEIRO “o dia todo” - movimento alongado;
(44) TOD@-SEMANA 2ª-FEIRA “ todas as segundas” - mov. alongado,
TOD@-SEMANA 4 a-FEIRA “todas as quartas”
Numeral na LIBRAS
As línguas podem ter formas diferentes para apresentar os numerais quando utilizados como cardinais, ordinais, quantidade, medida, idade, dias da semana ou mês, horas e valores monetários. Isso também acontece na LIBRAS.
Nesta língua é agramatical, ou seja,
errado a utilização de uma única configuração das mãos para determinados
numerais que têm configurações específicas que dependem do contexto,
por exemplo: o numeral cardinal 1 é diferente da quantidade 1, como em
LIVRO 1, que é diferente de PRIMEIRO-LUGAR, que é diferente de
PRIMEIRO-ANDAR, que é diferente de PRIMEIRO-GRAU, que é diferente de
MÊS-1.
Os numerais cardinais, as quantidades, e idade a partir do número 11 são idênticos.
Os números 22, 33, 44 e 77 sempre são articulados com a mão apontando para a frente do emissor.
Os numerais ordinais do PRIMEIRO até o
NONO têm a mesma forma dos cardinais, mas aqueles possuem movimentos
enquanto estes não possuem. Os ordinais do PRIMEIRO até o QUARTO têm
movimentos para cima e para baixo e os ordinais do QUINTO até o NONO têm
movimentos para os lados. A partir do numeral DEZ, não há mais
diferença entre os cardinais e ordinais.
Utilização dos numerais para valores monetários, pesos e medidas
Em LIBRAS para se representar os valores monetários de um até nove reais, usase o sinal do numeral correspondente ao valor, incorporando a este o sinal VÍRGULA.
Por isso o numeral para valor monetário
terá pequenos movimentos rotativos. Pode ser usado também para estes
valores acima os sinais dos numerais correspondentes seguido do sinais
soletrados R-L “real” ou R-S “reais”.
Para valores de um mil até nove mil
também há a incorporação do sinal VÍRGULA, mas aqui o movimento desta
incorporação é mais alongando do que os valores anteriores (de 1 até
nove reais). Pode ser usado também para estes valores acima os sinais
dos numerais corres-pondente seguido de PONTO.
Para valores de um milhão para cima,
usa-se também a incorporação do sinal VÍRGULA com o numeral
correspondente, mas aqui o movimento rotativo é mais alongado do que em
mil. Pode-se notar uma gradação tanto na expressão facial como neste
movimento da vírgula incorporada que ficam maiores e mais acentuados :
de 1 a 9 < de 1.000 a 9.000 < de 1.000.000 a 9.000.000.
Quando o valor é centavo, o sinal
VÍRGULA vem depois do sinal ZERO, mas na maioria das vezes não precisa
usar o sinal ZERO para centavo porque o contexto pode esclarecer e os
valores para centavos ficam iguais aos numerais cardinais.
Tipos de Frases na LIBRAS
As
línguas de sinais utilizam as expressões faciais e corporais para
estabelecer tipos de frases, como as entonações na língua portuguesa,
por isso para perceber se uma frase em LIBRAS está na forma afirmativa,
exclamativa, interrogativa, negativa ou imperativa, precisa-se estar
atento às expressões facial e corporal que são feitas simultaneamente
com certos sinais ou com toda a frase, exemplos:
· FORMA AFIRMATIVA: a expressão facial é neutra
(45) Meu nome M-A-R-I-A.
· FORMA INTERROGATIVA: sobrancelhas franzidas e um ligeiro movimento da cabeça inclinando-se para cima
interrog
(46) NOME QUAL? (expressão facial interrogativa feita simultaneamente ao sinal QUAL)
interrog
(47) NOME? (expressão facial feita simultaneamente com o sinal NOME)
(47) NOME? (expressão facial feita simultaneamente com o sinal NOME)
· FORMA EXCLAMATIVA: sobrancelhas levantadas e um ligeiro movimento da cabeça inclinando-se para cima e para baixo. Pode ainda vir também com um intensificador representado pela boca fechada com um movimento para baixo.
(48) EU VIAJAR RECIFE, BOM! BONIT@ LÁ! CONHECER MUIT@ SURD@
· FORMA NEGATIVA: a negação pode ser feita através de três processos:
a) com o acréscimo do sinal NÃO `a frase afirmativa:
negação
(49) BLUSA FEI@ COMPRAR NÃO;
(49) BLUSA FEI@ COMPRAR NÃO;
b) com a incorporação de um movimento contrário ao do sinal negado:
negação
(50) GOSTAR-NÃO CARNE, PREFERIR FRANGO, PEIXE;
(50) GOSTAR-NÃO CARNE, PREFERIR FRANGO, PEIXE;
negação
(51) EU TER-NÃO TTD;
(51) EU TER-NÃO TTD;
c)com um aceno de cabeça que pode ser feito simultaneamente com a ação que está sendo negada ou juntamente com os processos acima:
não
(52) EU VIAJAR PODER
(52) EU VIAJAR PODER
À guisa de conclusão
Compreender a gramática de uma língua é
apreender as regras de formação e de combinação dos elementos desta
língua. Nesta introdução, a LIBRAS pôde ser percebida a partir de
algumas classes gramaticais. Os estudos, já em andamento, aprofundando
nos pontos aqui apresentados e em outros não mencionados, poderão
mostrar a gramática desta língua.
Apêndice
SISTEMA DE TRANSCRIÇÃO SIMPLIFICADO
FIGURA - VERBOS COM INCORPORAÇÃO DE NEGAÇÃO
FIGURA - VERBOS COM CONCORDÂNCIA NÚMERO/PESSOAL
SISTEMA DE TRANSCRIÇÃO SIMPLIFICADO
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